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14/02/2022 às 00h00min - Atualizada em 14/02/2022 às 00h01min

Axé: intolerância religiosa no Brasil

Religiões de matriz africana ainda sofrem com o preconceito no país

Nicole Duarte - Editado por Júlio Sousa
Xapori socioambiental
Axé, na língua iorubá, significa poderenergia ou força presentes em cada ser ou em cada coisa. Nas religiões afro-brasileiras, o termo representa a energia sagrada dos orixás. Dentro e fora do contexto religioso, axé é uma saudação utilizada para desejar votos de felicidade e boas energias.

Dados compilados pela Comissão de Combate à Intolerância Religiosa do Rio de Janeiro (CCIR) mostram que mais de 70% de 1.014 casos de ofensas, abusos e atos violentos registrados no Estado entre 2012 e 2015 são contra praticantes de religiões de matrizes africanas.

Diferentemente das três grandes religiões monoteístas ocidentais (o cristianismo, o judaísmo e o islamismo), a umbanda e o candomblé não possuem uma tradição escrita marcada por um livro sagrado, como a bíblia, a torá e o corão. As religiões retratadas neste artigo possuem uma origem comum, nos ritos africanos, e uma tradição marcada essencialmente pela oralidade e, no caso do candomblé, pelo aprendizado religioso direto por meio da prática cotidiana da religião no terreiro (local onde são realizados os rituais religiosos tanto da umbanda quanto do candomblé).

cruel escravização de povos africanos em terras brasileiras ocasionou a mistura de povos e culturas diferentes. Em nosso país, fundiram-se a cultura, o sangue e os costumes de povos nativos (indígenas), africanos e europeus. Os africanos trouxeram consigo a prática de cultos religiosos comuns em todo o território africano destinados à gratidão e aos pedidos aos orixás (na mitologia africana são, em geral, divindades que ordenavam o mundo e estavam presentes, de maneira imanente, nas forças da natureza).

Num breve resumo, umbanda é marcada pelo forte sincretismo entre catolicismo, espiritismo e religiões afrobrasileiras. Candomblé
 é uma religião afrobrasileira, que foi trazida pelos africanos escravizados.






Segue a entrevista com Isabela do Carmo, umbandista

°O que é a "magia negra"?
Esse termo não deve nunca ser remetido à alguém da religião de umbanda ou candomblé, visto que, é um termo completamente pejorativo, sobretudo, racista - no qual usa-se o negro como algo ruim e indevido, oposto de algo bondoso. Uma pessoa de religião de matriz africana não saberá te responder sobre isso, justamente por isso não ter nada a ver com a nossa religião. É um termo que deve ser abolido do vocabulário. 

°Você já sofreu intolerância religiosa? 
Eu nunca sofri preconceito de maneira explícita, mas sim nas entrelinhas - o que é tão ruim quanto, pois fazem com que você se sinta coagida e envergonhada. Ao andar no transporte público com minhas guias expostas, já recebi olhares atravessados e negativos, como deboche. Além de estar no ambiente corporativo e ouvir, de colegas de trabalho, falas preconceituosas quanto à religião. 


°Por que você acha que existe tanto preconceito? 
O Brasil é um país racista e ultraconservador, ou seja, tudo que esteja fora daquele padrão preestabelecido pela sociedade cristã, é visto como errado e imoral. A ritualística umbanda é linda, representa fé, humildade e caridade, faz apenas o bem para o outro. A umbanda nasceu com o objetivo de usar a mediunidade em prol da humanidade, em foco no amor ao próximo. Os integrantes dessa religião estão apenas praticando o seu ato de fé, enquanto toda a sociedade os julga com um olhar discriminatório por não conhecer aquilo que nunca teve contato. A sociedade se afasta daquilo que é desconhecido, e tem impressões completamente equivocadas de uma religião que é apenas amor. 

°O que você gostaria de dizer para as pessoas que têm uma interpretação errada da sua religião?
Gostaria de pedir respeito, que pessoas cristãs (católicos e evangélicos) tenham respeito para com aqueles que praticam religiões diferentes das suas, pois a umbanda é apenas amor e caridade. Se permita conhecer o desconhecido, e mantenha sempre o respeito para aquilo que é diferente de si.

A capoeira e o candomblé: Dos Quilombos surge a Capoeira. Brincadeira utilizada pelos escravos como uma forma de distração, mais tarde se tornou instrumento de luta e defesa e este jogo da Capoeira segue presente até os dias de hoje e é constantemente associado aos terreiros de Candomblé. Considerada pelos estudiosos com uma expressão cultural afro-brasileira, a Capoeira une elementos tradicionais originados dos negros da África e dos ritmos brasileiros como o Samba e axé.


Segue a entrevista com o capoeirista Marcos Victor:

▪︎Qual a ligação entre a capoeira e o candomblé?
A capoeira foi criada aqui no Brasil, mas com a total participação de negros africanos que foram trazidos e aqui foram escravizados. Trouxeram junto sua fé, seus costumes e algumas tradições, que foram oprimidas junto à eles. 

▪︎Você já sofreu algum tipo de preconceito por intolerantes religiosos? (se sim, conte)
Disfarçadamente sim. E quando percebi o preconceito, mostrei que tinha conhecimento sobre o assunto e repreendi, com toda educação dada por Dona Vera (minha digníssima mãe rs). Vi o quanto é importante o conhecimento a partir de momentos como esse, assim tenho forças para defender com sabedoria o que tanto amo. 

▪︎Você se identifica com algum orixá do candomblé?
O meu apelido de capoeira que não me deixa mentir, Erê é a criança, a brincadeira, o brincar... Eu sou bem próximo disso rs, e respeito demais!

▪︎Já teve alguma experiência com a religião?
Já. Por pessoas conhecidas, por estudos e pessoalmente... Me permiti conhecer pra entender pra não julgar sem saber. Sou Católico e respeito por demais a minha religião e a religião em questão. 

▪︎Como você acha que a capoeira melhora o respeito das pessoas em relação às religiões de matriz africana?
Como dito antes, por ter essa aproximação referente às pessoas que praticam tanto a capoeira quanto a religião. Só pra esclarecer pros leitores... A capoeira, como pensam a maioria, não é religião. O ser humano (capoeirista) tem a religião a qual prefere seguir. Sou uma pessoa curiosa e isso me ajudou a compreender meu apelido e, a partir daí, entender o porquê de várias Cantigas cantadas nas rodas de capoeira dizem a respeito, apelidos de outras, e o povo que nos trouxe essa Arte que é tão rica em movimentos, música, instrumentos, história, tradições, costumes e muito mais. Antes de tudo a capoeira é conhecimento, se você a conhece e gosta, você pratica ou admira. Se você não a conhece, te convido a conhecer, ou argumentos direcionados, serão somente palavras jogadas ao vento.




 

E para quem chegou até aqui, desejo meu sincero Axé!


 

 

 

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