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18/02/2022 às 22h36min - Atualizada em 18/02/2022 às 22h35min

Os terrores do nazismo permanecem ecoando

O sistema que ceifou a vida de Anne Frank ainda tem apoiadores com seus discursos de ódio

Jerusa Vieira - Editado por Andrieli Torres
Getty Images

Uma adolescente judia de 13 anos com sonhos, metas a serem alcançadas, disposição para estudar e desejo de viver. Anne Frank teve seus últimos dois anos de vida marcados por uma turbulenta e angustiante história de incertezas, medos e de tragédias, que foram registrados em seu diário transformado no livro “O diário de Anne Frank”. Devido à invasão dos alemães nazistas à Holanda, ela, sua família e mais quatro pessoas tiveram que se esconder em um anexo secreto. Foi aí que a liberdade foi ceifada e um dia a dia de limitações, terror, dificuldades passou a ser rotina para os judeus.

Atuação do nazismo e o Anexo Secreto



Com o discurso de haver uma raça suprema, a ariana, e disseminar os estrangeiros, o nazismo ganhou força na Alemanha com a liderança de Adolf Hitler e se expandiu para outros países com essa ideologia racista e violenta. É considerado um regime fascista por ter características similares, como: ser autoritário, prever a concentração total do poder, glorificação de um líder, exaltação da coletividade nacional, expansão de territórios, controle dos meios de comunicação. O nazismo é, portanto, uma forma de manifestação do fascismo. Algumas das principais características da filosofia nazista desenvolvida por Hitler era o racismo, a xenofobia, o nacionalismo, o antissemitismo – o preconceito e ódio contra os judeus – e o anticomunismo – a negação do comunismo e de seus seguidores.

Os nazistas alemães invadiram a Holanda, país onde Anne morava, em 1940, e introduziram leis e regulamentos que tornaram a vida dos judeus bem mais difícil. Nesse mesmo ano, os alemães começaram a construir instalações que serviriam como campos de concentração e de extermínio de inimigos e grupos indesejáveis da sociedade. Os judeus eram proibidos de irem a parques, cinemas, lojas não-judaicas, entre outros lugares e não era permitido que eles tivessem empresas próprias. Além disso, todas as crianças judias, incluindo Anne, tiveram que ir para uma escola judaica separada. Eles tiveram de começar a usar uma estrela de Davi costurada na roupa e surgiram rumores de que todos eles teriam de deixar a Holanda.
 

Foi nesse cenário desesperador que o anexo secreto serviu como uma esperança para a família de Anne. Escondidos do risco de serem capturados pelos nazistas, os abrigados no anexo passaram dias de fome e medo em cada explosão e no mínimo barulho de presença indesejada. O banheiro era revezado entre as pessoas escondidas, porém cada uma podia passar no máximo 15 minutos dentro dele. Como o anexo ficava acima de um armazém em funcionamento, no horário de serviço dos funcionários, eles tinham que ficar em silêncio e até andar de meias para não suspeitarem que havia alguém ali.



Se viver uma adolescência já é difícil e confuso para qualquer um, imagina para alguém que se encontra privado de liberdade e condições básicas de vida, sem ao menos saber quando sairá. No início de novembro de 1944, Anne e sua irmã Margot são deportadas para o campo de concentração de Bergen-Belsen. Os seus pais ficam em Auschwitz. As condições em Bergen-Belsen são miseráveis: quase não há comida, passaram frio, e Anne, como a sua irmã, ficaram com febre tifóide. Em fevereiro de 1945, ambas morreram das consequências dessa doença.


Ainda há quem apoie
 

Mesmo com registros de toda a tragédia que foi a ação do nazismo, que matou mais de seis milhões de judeus durante o Holocausto, perseguiu e aprisionou outras minorias (como ciganos, homossexuais e negros), discursos discretos ou escrachado de apologia a essa ideologia continuam ecoando. Influenciadores de todas as áreas surgem com discursos que diminuem e fere a existência de alguém. Mesmo com toda a luta ao longo dos anos para haver um respaldo na lei para a criminalização e punição de atos racistas, casos de apologia ao nazismo ainda são noticiados e vidas continuam sendo perdidas por atos violentos.

Dentre os exemplos mais recentes está a infeliz fala do podcaster Bruno Aiub do Flow Podcast, conhecido como Monark, durante um programa ao vivo, no dia 7 de fevereiro de 2022, enquanto era discutido sobre o tema liberdade de expressão. "A esquerda radical tem muito mais espaço do que a direita radical, na minha opinião. As duas tinham que ter espaço. Eu sou mais louco que todos vocês. Eu acho que o nazista tinha que ter o partido nazista, reconhecido pela lei", disse Monark.  E acrescentou: “Se o cara quiser ser um antijudeu, eu acho que ele tinha direito de ser”. A deputada Tabata Amaral  (PSB-SP) participava do programa em questão e rebateu: "liberdade de expressão termina onde a sua expressão coloca em risco a vida do outro (...) O nazismo é contra a população judaica e isso coloca uma população inteira em risco". O Flow é um dos podcasts com maior audiência no Brasil, com mais de 3,6 milhões de inscritos só no YouTube.



Após a repercussão desse episódio, Monark foi desligado dos Estúdios Flow e está sendo investigado pelo Ministério Público Federal (MPF). Além disso, várias empresas romperam contrato com o podcast. Um dia após a demissão de Monark, o comentarista da Jovem Pan, Adrilles Reis, estava comentando sobre o caso e fez um gesto nazista que era usado no período de Adolf Hitler. Isso repercutiu na internet e até a própria emissora condenou o ato e o demitiu. Além disso, ele também está sendo investigado pelo MPF por apologia ao nazismo, e se for condenado pode receber uma pena de 1 a 5 anos de prisão ou pagamento de multa.


No dia 20 de novembro de 2021, o músico Dennis Sinned foi espancado por cerca de dez homens em frente a  um bar na zona oeste de São Paulo e uma faixa com a frase “orgulho branco não é crime”, e a imagem de uma cruz celta, elemento associado a grupos nazistas, foi pendurada numa passarela na avenida Nove de Julho, uma das principais vias do centro da cidade. Em junho do mesmo ano, um adolescente de 17 anos foi expulso de um shopping center de Caruaru (PE) após ser flagrado ostentando uma suástica (a cruz gamada do nazismo) no braço. No dia seguinte, o secretário de Turismo de Maceió, Ricardo Santa Ritta, foi às redes sociais e expressou surpresa com o tratamento dado ao jovem: “Pensava que a liberdade de expressão existisse”. A prefeitura rapidamente demitiu o secretário municipal.


Libertação de Auschwitz


No último dia 27 de janeiro, o Dia Internacional da Lembrança do Holocausto, completou 77 anos de libertação do Campo de Concentração de Auschwitz, onde judeus eram mantidos prisioneiros, realizando trabalho forçado e em condições desumanas. Também conhecido como o local de extermínio de judeus e minorias, pelos nazistas, durante a Segunda Guerra Mundial. Mesmo sendo libertos, as consequências psicológicas e físicas permaneceram para os sobreviventes.

 

Andor Stern, de 91 anos, foi um desses sobreviventes. Em entrevista para a BBC ele contou o terror que vivia em Auschwitz. "Você tem eczema, sarna. A comida te causa uma eterna diarreia, o que, aliás, é (uma das causas) o que mais matava as pessoas. No inverno, abaixo de 22, 24, 26 graus, quando você está 'vazando', você até gosta porque é quentinho. E você não tem como tomar banho depois disso. Você aceita a sujeira, a imundície. E você perde a condição de ser humano. Devora qualquer casquinha de batata. Só o que pensa é na fome. Você vira um zumbi”, relatou Andor, e acrescentou: "Uma mesma bacia de noite é penico e de dia é o prato em que você come. E você come como cachorro. Não tem garfo, faca, colher".


Mesmo com o fim do regime nazista e o surgimento de mudanças legislativas que criminalizam essa ideologia, discursos e atos de ódio permanecem na sociedade. Muitas vezes ditos como “liberdade de expressão”, são apoiados por extremistas e até mesmo por figuras públicas que exercem certa influência na sociedade, contribuindo para a expansão de pensamentos discriminatórios. A partir do momento em que há o discurso de diminuir ou excluir uma raça ou um grupo de pessoas, está ferindo a existência humana e, assim, incentivando o ódio e fazendo apologia ao nazismo e a diferentes formas de preconceito.


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