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17/02/2023 às 11h38min - Atualizada em 17/02/2023 às 11h32min

Polêmica da Colleen Hoover: há responsabilidade em sua escrita?

Recentemente, a escritora se envolveu em diversas polêmicas na internet, deixando seus leitores reflexivos sobre seus livros

Julia Maíse - Editado por Larissa Bispo
Créditos/Reprodução: Internet

A escritora estadunidense Colleen Hoover ficou famosa pelos seus livros de “romance” que, em sua maioria, viralizou nas plataformas Tiktok e Instagram, e lido, principalmente, pelo público feminino juvenil. Inclusive, chegou a ser aos mais vendidos no The New York Times.

 

Entretanto, vale ressaltar que em seus livros a escritora trabalha assuntos muitos engatilhados e de uma forma nada cuidadosa. Dois exemplos são a violência doméstica e o relacionamento abusivo. Recentemente, Colleen se envolveu em polêmicas ao lançar um livro de colorir com seu romance "É Assim Que Acaba”. 

  

“De repente, não estou mais rindo. Estou no chão, pressionando a mão no canto do olho. Em questão de um segundo, o braço de Ryle apareceu do nada e me atingiu, me derrubando para trás. Ele usou força suficiente para que eu me desequilibrasse. Quando caí, meu rosto bateu em um dos puxadores do armário.”


Após a violência ter sido cometida, Lily, vítima do livro, perdoa Ryle nesse e em acontecimentos futuros, acreditando que ele vai mudar suas ações.

 

“Tento me afastar, mas ele está me segurando com tanta força que nem se mexe. A dor dos seus dentes perfurando minha clavícula se espalha pelo ombro e desce pelo braço. Imediatamente começo a chorar. A soluçar”.


Dentre outros diversos momentos dessa obra literária, que ela quis transformar em um livro de colorir, tamanha relação abusiva que é retratada. 

 

Mas por quê? Porque um livro assim é tão famoso e romantizado na internet? Pessoas que leem acabam postando em suas redes sociais e geram era diversos comentários, causando repercussão e deixando outros leitores curiosos. É um ciclo que faz livros ficarem famosos nas redes sociais, mesmo que haja problemáticas nele. Como a ausência de sinais de gatilhos por parte da autora, que trata sem nenhuma consciência emocional esses assuntos complexos como esse.

 

Além disso, suas vítimas, quando saem de uma situação de abuso, se envolvem com outro homem que a respeite, como se a situação só se resolvesse quando outro parceiro aparece. Na realidade, não é assim. A vítima carrega traumas, tem dificuldades para se envolver com outras pessoas e precisa buscar ajuda terapêutica. Somando a essa romantização de toda a problemática na falta de sensibiidade ao escrever, ela não instiga as vítimas do livro - e, consequentemente, aos seus leitores - a realmente procurar ajuda, seja em denúncias ou em apoio psicológico.  

 

– Leticia, poderia me contar um pouco sobre como foi o seu processo para se recuperar do relacionamento abusivo que você passou?

 

– O meu principal meio de ajuda para superar esse trauma foi através da terapia. Obviamente é uma ferida que você carrega por anos e que parece que nunca cicatriza totalmente, mas o tempo e as novas experiências fazem com que doa menos.

 

– E como você, vítima de um relacionamento abusivo, se sente em relação com as escritoras que trabalham em seus livros esse tipo de relacionamento, romantizando e sem acrescentar como lidar com o trauma?

 

– Me sinto invalidada, e creio que é uma reação normal. É como se tudo que tivesse vivido fosse reduzido a nada, as pessoas que não vivenciaram acabam achando normal também, e isso gera uma bola de neve, romantizando cada vez mais e fazendo com a vítima perdoe e se sinta culpada no final.

 

Assim como uma vítima se sente dessa forma, várias outras podem se sentir engatilhadas da mesma maneira. Até mesmo jovens que nunca passaram por essa situação podem ter medo de acabar vivendo isso. Meninas consomem esse tipo de conteúdo e, com o tempo, acabam percebendo o quão problemático é. Exemplo disso é Pietra e Ana Letícia, de 16 e 17 anos, respectivamente. Elas já leram em média 4 livros da escritora.

 

“O primeiro livro que li da Colleen eu tinha 14 anos. No começo as histórias me prendiam muito, mas com o passar do tempo, em que eu fui amadurecendo, percebi tópicos problemáticos abordados de forma inadequada por ela.”, relata Letícia.

 

Em entrevista, pergunto se elas, sendo jovens e leitoras, tiveram alguma reação negativa em relação a como a Colleen retrata assuntos problemáticos em seus livros.

 

“Sim. Acredito que ela escreve de uma forma superficial sobre os temas, não aprofunda como deveria”, diz Pietra. “Muitas vezes a história vende a ideia de que o amor é a solução, algo completamente errado, mas que definitivamente vai afetar públicos mais jovens que acabam tendo muito acesso a esses livros fora de sua faixa etária devido a grande repercussão que eles têm.”

 

“E além disso,”, Letícia acrescenta, “acho que sempre ela sempre retrata um homem padrão com traços problemáticos. Mas, ao ser padrão, os leitores ficam fascinados e acabam desculpando as ações, como ocorreu em Novembro 9. Acho totalmente bizarro o que acontece nesse livro, e no final dele. E, como leitora, não desejo um romance como foi abordado.”

 

Elas concordam que Colleen precisa retratar esses assuntos sensíveis com mais cuidado e não escrever com irresponsabilidade para qualquer romance jovem, principalmente querendo transformar um deles no livro de colorir. Isso porque, além de ser algo desnecessário, abre porta para um público mais jovem ter contato com essa temática de uma forma que não devia. 

 

Não é uma forma responsável de se tratar esses assuntos tão tabus, instigando aos leitores perdoarem o abusador, sem ao menos levá-lo a sofrer uma consequência dos seus atos no final. Como também os leitores levarem como exemplo as ocorrências dos livros para a vida real, de que não se pode aceitar tratamento tóxico, em qualquer relação.


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