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23/04/2023 às 23h59min - Atualizada em 03/05/2023 às 17h30min

​Cidade Invisível: Uma reapresentação da cultura popular brasileira

Uma combinação de drama, suspense e fantasia para contar histórias nacionais

Júlia Gonçalves - Revisado por Nildi Morais
Netflix lança segunda temporada de 'Cidade Invisível'. (Foto: Divulgação/Netflix)

A série Cidade Invisível, criada por Carlos Saldanha e que teve a segunda temporada lançada recentemente, está repetindo o sucesso da primeira temporada se mantendo entre as mais vistas em diversos países do mundo mesmo após semanas de sua estreia. Pode-se dizer, em uma leitura rápida, que seu criador resgata o folclore brasileiro em uma versão adaptada para adultos e coloca a literatura nacional no circuito internacional, mas Carlos Saldanha faz mais do que isso. 
 
Brasileiros de todas as regiões cresceram ouvindo, lendo ou assistindo histórias que de alguma forma mencionavam o folclore, como é o caso do Sítio do Pica-Pau Amarelo de Monteiro Lobato. Essas histórias folclóricas fazem parte da essência do país há muitos anos, como produto da mistura entre culturas indígenas, africanas e europeias que formam a nação. Que criança não ouviu a música “nana neném, que a Cuca vem pegar”? Quem nunca ouviu sobre as peripécias do Saci ou do canto da Iara?
 


 
A tradição oral é responsável por fazer esses mitos circularem em diferentes contextos, sendo contadas de inúmeras maneiras e versões, com personagens que podem mudar de características dependendo da região ou da geração que ouve. Da mesma forma que a adaptação de Saldanha foi feita sem a menor cerimônia em relação ao contexto moderno, assim são as práticas de transmissão da cultura brasileira.
 
Com o passar do tempo, essas histórias acabaram perdendo forças, pouco se fala sobre essas entidades místicas. As gerações mais novas ouvem sobre eles uma ou duas vezes durante o período escolar e só isso. Rodas de conversas entre amigos e familiares, contando sobre esses seres e até as suas experiências pessoais ao cruzarem com eles, deixaram de acontecer. Assim, a série surge com o objetivo de reavivar essas memórias populares e reacenderem costumes antigos que estão se perdendo com o passar dos anos.
 
Sobre a série
 
Durante a primeira temporada de Cidade Invisível, os espectadores são apresentados ao protagonista Eric (Marco Pigossi), um detetive da policia ambiental que perdeu sua esposa em um incêndio misterioso. A vida dele começa a se transformar quando se depara com um boto cor-de-rosa morto em uma praia do Rio de Janeiro, a partir desse encontro seu caminho se cruza com o das figuras folclóricas que vivem misturados aos seres humanos comuns. Com o objetivo se deter um perigoso espírito que deseja eliminar as entidades, Eric se alia com personagens famosos como o Saci/Isac (Wesley Guimarães), o Curupira (Fábio Lago), a Cuca (Alessandra Negrini), entre outros.
 
Já a segunda temporada retorna dois anos após os eventos finas da primeira. Eric reaparece em um santuário indígena próximo a Belém do Para, depois de passar um tempo desaparecido. Luna (Manu Dieguez), sua filha, segue em busca do pai na companhia de Cuca. Juntos, os personagens se envolvem em um novo conflito conforme garimpeiros tentam destruir o santuário indígena e Eric tenta entender e aceitar suas origens como parte do folclore.
 

Trailer oficial de 'Cidade Invisível'. (Reprodução: Netflix Brasil - YouTube)


 

Misturando o místico com a rotina brasileira, a série permite que as entidades vivam como pessoas comum, seja no Rio de Janeiro ou em Belém. Vivendo nas periferias, passando por pontos turísticos famosos, nas aldeias, as figuras folclóricas se apresentam durante a série como donos de bar, cantores, defensores públicos, parte de famílias poderosas.

Além disso, Cidade Invisível possui a genialidade de dar destaque a um problema político, socioambiental e cultural de efeito genocida pela via da literatura. A trama se desenrola em torno de uma investigação policial sobre disputas econômicas de reservas naturais que traz à luz diferentes sujeitos – mitológicos e humanos – à beira da extinção. Nesse sentido, o folclore é alegoria para uma discussão política sobre essas disputas e traz à luz as existências de toda uma população que, em meio ao contexto moderno, luta pela sua preservação, pelo direito de existir, que vai sendo fortemente atacada a cada capítulo. O enredo da série é cultural e, sobretudo, político. 
 
O folclore brasileiro em terras estrangeiras
 
A produção da Netflix abre uma janela para a importância sociocultural do folclore brasileiro. Sendo uma das maiores riquezas do país, é também parte do patrimônio cultural, não só internamente, mas para o mundo.
 
A mitologia brasileira é, talvez, uma das mais ricas do mundo, graças à grande mistura de etnias e culturas que o compõem. E da mesma forma que histórias como Hércules, Percy Jackson e tantas outras entidades estrangeiras fazem sucesso internamente, é importante que nossas histórias também façam sucesso lá fora. Exibir a mitologia nacional para além das fronteiras nos permite uma tentativa de alcançar patamares e um sucesso semelhante ao que os mitos gregos e egípcios conquistaram na sociedade.
 


 
Com o auxílio da plataforma de streaming, a série poderá ser vista em 190 países. Ela chega para mostrar que produções brasileiras são sim dignas de atenção e que o nosso país é capaz de entregar ótimas produções, ricas em roteiro, narrativa e visual. Explorar nosso folclore de forma sombria e dramática é uma ótima maneira de elevar nossos mitos e lendas ao patamar aclamados de outras mitologias.
 
Levar as histórias que cercam o imaginário popular brasileiro para outros países representa muito mais que enaltecer e apresentar parte da nossa cultura para outros povos. É também uma forma de difundir um pouco dos costumes indígenas, seus rituais, suas línguas e sua importância para a preservação de traços originais do Brasil e de tantas reservas ambientais.
 
Além de trazer as lendas mais populares e conhecidas de maneira repaginada, mostrando sempre que até mesmo esses seres possuem um lado bom e um lado mal, a série revela personagens pouco conhecidos, típicos de regiões específicas, que até mesmo a população brasileira desconhece suas histórias.
 
Uma prova do sucesso de Cidade Invisível no exterior é vista nos dados da plataforma responsável pela obra: nos Estados Unidos, a produção chegou a ocupar o 1º lugar do Top 10 durante alguns dias. Além das inúmeras avaliações positivas da crítica internacional.


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