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17/04/2024 às 13h24min - Atualizada em 17/04/2024 às 14h17min

Cuidados com a língua (portuguesa)

A origem preconceituosa de termos em nosso idioma

Dominik Pereira - labdicasjornalismo.com
Reprodução/Brainly
O nosso vocabulário é muito rico e vasto, e existe uma diversidade de palavras e expressões sem tamanho para ser explorada quando nos comunicamos. Em meio às variações linguísticas que ocorrem com o tempo e com mudanças sociais, a língua está em constante evolução. Nesse contexto, muitas expressões usadas nos dias de hoje surgiram em épocas diversas, como no período colonial, quando houve a escravidão, e em tempos de opressão.

Cabe destacar que a língua portuguesa formou-se a partir de mesclas entre latim, celta e árabe. Segundo a pesquisadora Amini Boainain Huay, a origem da língua portuguesa pode ser dividida em três fases: pré-histórica, proto-histórica e histórica. A primeira fase se refere ao início rudimentar da nossa língua, antes do século X. Huay diz que "a época pré-histórica é o período de evolução do latim falado na Galiza e na Luzitânia, desde a conquista da Península Ibérica até a formação dos romanços, no século V, culminando com a definição do romanço galaico-português como língua falada nas duas margens do rio Minho".

Para a pesquisadora, ainda, a fase proto-histórica se refere à organização da língua em torno do galego-português, língua falada na Idade Média nas regiões de Portugal e Galiza. A partir do século XIII, inicia-se a fase histórica, ou seja, o português tomava sua forma e estava em constante aperfeiçoamento, até chegar ao português atual. Devido à característica de transformação constante da língua, muitas palavras e expressões carregadas de preconceito surgiram conforme os acontecimentos históricos.


O Lab Dicas Jornalismo listou alguns termos cuja origem é preconceituosa e que, atualmente, entende-se que são inadequados.

Palavras de origem escravocrata

Mulata 
é uma palavra do período escravocrata, usada para se referir a pessoas descendentes de brancos com negros. O termo vem do latim mulus, usado para se referir ao cruzamento de cavalos/éguas com jumentas/jumentos. Os filhos dos senhores coloniais com as escravas, concebidos por violência sexual, eram chamados de mulatos, fazendo analogia à mistura de cores.
Da cor do pecado é uma expressão usada para se referir à mulher negra e tem um forte apelo à sexualização do corpo negro. Apesar de parecer um elogio, não é. A TV Globo produziu uma novela com esse nome, em 2004, e hoje a produção é criticada por reforçar essa ideia.
Denegrir é uma palavra que se refere ao ato de manchar ou sujar a imagem de alguém. O termo atribui uma visão negativa sobre o que é escuro, negro. 
Inveja branca é uma expressão usada para dizer que é uma "inveja boa", mas reforça a ideia de que o branco é algo bom, puro, sem maldade, opondo-se ao preto, que seria ruim.
Nas coxas e serviço de negro são expressões usadas para dizer que algo está mal feito ou feito de qulaquer jeito, reforçando o estereótipo de que pessoas negras não trabalham direito.
Meia tigela (medíocre e sem valor) as pessoas escravizadas que não atingiam a meta de trabalho só ganhavam meia tigela de comida, então a expressão se popularizou para se referir a algo insignificante.
Criado-mudo (mesinha de cabeceira) durante a escravidão, os senhores faziam pessoas negras segurarem objetos e eram proibidos de falar.

Capacitismo

Nos últimos anos, o combate a expressões capacitistas também ganhou força a partir do movimento em defesa dos direitos das pessoas com deficiência. Capacitismo é o preconceito contra pessoas com deficiências físicas e intelectuais. Essa discriminação está tão arraigada socialmente que, às vezes, usamos palavras e expressões capacitistas sem nos darmos conta.

Retardado é uma palavra usada para depreciar alguém diante de um erro cometido, mas reforça o capacitismo. 
Fingir demência é uma expressão usada para dizer que não compreendeu alguma situação ou ideia. A demência é um diagnóstico médico sério, em que a pessoa afetada sofre com a perda de suas habilidades gerais, como memória e raciocínio.
João-sem-braço é uma expressão usada para se referir a uma pessoa preguiçosa ou que foge das suas responsabilidades. Imagine uma pessoa com a deficiência de um membro ouvindo algo assim. 
Você está cego/surdo? pergunta-se "Você está cego?" quando a pessoa não encontra algo que está a sua frente. Trata-se de uma pergunta desrespeitosa e preconceituosa. A deficiência de uma pessoa não deve ser apontada como se fosse algo errado.


Assim como existem palavras e expressões que perpetuam o racismo e o capacitismo, existem também as que reforçam o machismo e a homofobia, entre outras opressões. É preciso um novo olhar sobre a língua, para liquidar o preconceito. Deve-se dar mais atenção às palavras usadas no dia-a-dia, de modo a evitar expressões entendidas como inadequadas, mas isso requer um esforço coletivo. O debate em torno da língua portuguesa cresce a cada dia, e é preciso que mudanças significativas aconteçam.

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