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18/03/2024 às 17h13min - Atualizada em 18/03/2024 às 12h09min

Terceira temporada de As Five: o fim de uma era?

A última temporada da série deixa claro: esse com certeza não deveria ser o fim.

Gabrielly Leopold - Revisado por Danielle Carvalho
Ensaio promocional da terceira temporada de As Five. (Foto: Reprodução/Globo)

Protagonistas inesquecíveis, plots que conversam com uma geração e talentos que são um verdadeiro tesouro para o audiovisual nacional, além de uma amizade inspiradora dentro e fora das telinhas. Tudo isso conquistou uma geração de fãs, que não estava pronta para se despedir das five quando a novela “Malhação - Viva a Diferença” terminou em 2018, e após muita movimentação nas redes sociais e diversas hashtags em alta no Twitter, o tão sonhado spin-off saiu.

Um toque de amadurecimento

Desde a primeira temporada, é impossível não mencionar as evoluções significativas do roteiro. Conduzir 5 protagonistas dentro de uma série não é uma tarefa simples, tampouco igual às novelas, mas com o passar das temporadas isso foi feito com maestria e, na terceira, é nítido o quanto o desenvolvimento dos plots é mais conciso e as questões individuais de cada uma não se perdem em meio aos plots secundários. As atrizes estão ainda mais maduras e refletem muito bem a seriedade dos desafios enfrentados por suas personagens. 

Tina (Ana Hikari) passa a enxergar seu vício em álcool, de fato, como um problema, o que a leva para um dos plots mais sérios e bem trabalhados da temporada. Já Lica (Manoela Aliperti) permanece com seu temperamento mimado, mas entende que se quiser ser levada a sério e dar um passo adiante em seu relacionamento com Maura (Tamirys O’hanna) é hora de amadurecer.

Para Ellen (Heslaine Vieira) é o momento de dar uma chance aos seus próprios sentimentos e compreender o amor, embora resolver uma equação matemática seja muito mais simples para ela. Entre as descobertas de Benê (Daphne Bozaski), nessa temporada uma questão muito presente na vida dos artistas a atinge: precisar que a sua arte seja “comercial” e perder a liberdade de criar pelo prazer de fazer o que gosta. E a sonhadora Keyla (Gabriela Medvedovsky) parece ter finalmente encontrado um amor tranquilo, mas misturar romance e negócios pode ser mais complexo do que imagina.

O ritmo do fechamento da série é gostoso de acompanhar, os episódios têm cerca de 40 minutos e se livram da pressa que já vimos em outras temporadas. Tudo é bem trabalhado e há um equilíbrio maior no tempo de tela das histórias dos personagens secundários, com foco naquelas que são realmente interessantes de acompanhar como Michelle Esmeralda (Marcos Oli) e Guto (Bruno Gadiol), que surpreenderam o público com uma dupla repleta de química e carisma.

Compromisso com a verdade, retrato fiel da vida adulta

Desde o começo, a série deixa claro que não pretende romantizar as dificuldades da vida adulta e criar uma utopia de que o cotidiano das protagonistas vai ser sempre perfeito. Para alguns, o drama em excesso pode ser considerado um problema, mas nessa temporada ele vem na medida certa e ainda reforça a importância de se ter uma rede de apoio nessas horas.

Ana Hikari é um dos grandes destaques dessa temporada justamente por isso, ela dá vida ao sofrimento da Tina mostrando diferentes nuances do alcoolismo e o prazer ilusório causado pela fuga da realidade proporcionada pela bebida. Com uma atuação madura e comovente, a atriz mostra toda a ruptura da personagem que sempre se mostrou como “bem resolvida” e consciente de seus próprios atos, agora em seu estado mais frágil após um blackout ocasionado pelo álcool.

Por falar em rede de apoio, a série frisa um dos aspectos mais importantes: para conseguir cuidar de outra pessoa e prestar suporte à ela, é necessário cuidar de si primeiro. Tina engata um relacionamento com Glauber (Elzio Vieira) e acaba descobrindo que ele é um ex alcoólatra, ambos tentam se ajudar, Glauber a leva para as reuniões do “Alcoólicos Anônimos”, mas no fim das contas, esperavam ser o antídoto um do outro quando na verdade são o próprio veneno. Os dois precisam se cuidar sozinhos, antes de tentar ajudar o outro, afinal, é impossível ser o suporte de alguém se você ainda está em pedaços.

Em um dos episódios mais emocionantes da temporada, fica claro o quanto o porto seguro de Tina é a amizade das meninas. Quando a personagem não consegue se lembrar do que aconteceu na noite passada e pode ter sido vítima de violência sexual, as amigas entregam a sensibilidade, preocupação e acolhimento necessários para Tina, num momento em que isso é tudo o que a personagem necessita. O sexto episódio da temporada marca um dos pontos mais significativos e maduros da carreira de Ana Hikari até aqui, comprovando toda a entrega e estudo para viver uma personagem de tamanha complexidade. 

Podia ter sido, mas não foi

Quando se trata de relacionamento, é difícil não pensar no plot de Lica e nas proporções que isso tomou. Nessa temporada, vemos a jovem mover céus e terra para não perder Maura, seu compromisso com o amadurecimento tem sim um pouco a ver com a namorada, isso é fato. Mas apesar da personagem de Tamyris O’hanna ser uma mulher extraordinária, é difícil não pensar no quanto o par romântico com Lica é incoerente.

Maura tem uma maturidade e vivências que são completamente contrárias à falta de visão de futuro da Lica. O tempo inteiro, ficamos com a sensação de que algo não se encaixa, até mesmo em termos de personalidade, é como se constantemente ela tivesse que aguentar certos comportamentos da Lica mesmo estando de saco cheio. Por ser uma mulher tão consciente e bem resolvida, é quase inverossímil pensar em um relacionamento com uma jovem adulta sustentada pela mãe.

Ainda que Lica esteja disposta a, finalmente, abrir mão de seus privilégios e crescer, fica a dúvida se essa mudança seria genuína se não tivesse uma paixão no meio. Pensando assim, Lica e Maura têm cenas que a audiência sempre esperou ver com ‘Limantha’, casal que iniciou em Malhação com a personagem Samantha (Giovanna Grigio). Fica a saudade e a sensação de: se houvesse uma quarta temporada, teríamos o casal de volta? 

Ellen em: “pensei que era infarto, mas era apenas amor”

Amar é tão complexo que, às vezes, preferimos acreditar nas hipóteses mais malucas do universo a admitir que estamos apaixonados. Quem nunca, não é? Mais um ponto alto que foi super divertido de acompanhar foi Ellen experimentando as diferentes nuances do amor, enquanto uma pessoa que sempre foi super racional e adepta às teorias matemáticas, não há equação que explique o que um coração apaixonado é capaz de nos fazer sentir.

Heslaine Vieira nos entrega todo o seu carisma enquanto Ellen tenta se permitir mais. É maravilhoso ver a personagem se entregando para o afeto, até mesmo procurando por um amor específico nas pessoas erradas, mas sempre com muita leveza. No fundo, ela sabe que o seu coração bate mais forte por Lito (Matheus Campos), mas isso não a impede de tentar ignorar isso ao se envolver com outras pessoas.

Depois de lidar com a exposição gerada pelo caso de racismo que sofreu na Mid Tech, a nossa nerd favorita agora foca em seus sentimentos e desejos. Tentando entender o amor com fórmulas matemáticas, chega a pensar que há algo de errado com seus batimentos cardíacos quando na verdade ela só está completamente apaixonada. Ellen precisava de um pouco mais de leveza e consegue isso com maestria na temporada final.

Ainda existem sonhos pela frente

Apesar da tentativa de final fechado, fica implícito o cancelamento da série, especialmente se você considerar que o anúncio de que essa seria a temporada final foi feito às pressas e com cerca de 1 mês para a estreia. Dito isso, vemos alguns plots com um potencial imenso de desenvolvimento nas próximas temporadas sendo desperdiçados por uma estratégia pouco assertiva: um cancelamento antes da estreia.

É inegável o quanto Keyla, por exemplo, merecia mais. A personagem tem um arco ótimo na terceira temporada e nos reforça a importância de se ter um relacionamento saudável, especialmente após um histórico de relações duvidosas, mas falta o desenvolvimento de seus próprios sonhos. Apesar de ter se dado bem como dona do “Ladeira das Minas”, que por sinal se torna um espaço fantástico e que deixa um gostinho de quero mais, a ausência de novas temporadas perde a oportunidade de desenvolver o maior sonho da Keyla que era investir na carreira de cantora e atriz. Essa seria a cereja do bolo no desenvolvimento de uma personagem que tanto sofreu.

A possibilidade de mais personagens queridos, que fizeram parte da novela, retornarem em uma possível quarta temporada é nítida, mais um dos motivos para que o público não se conforme com um final assim. Com a viagem de Benê, há um gancho para que Josefina (Aline Fanju) e Roney (Lúcio Mauro Filho) talvez fizessem uma pequena participação em próximas temporadas, embora não houvesse nada confirmado, as possíveis ramificações do roteiro não descartam a hipótese.

E, por falar em Benê, suas aventuras sempre foram uma das coisas mais dinâmicas, inusitadas e incríveis de se acompanhar. Daphne Bozaski nos apresentou com maestria, em três temporadas, um lado diferente e mais livre da personagem, que com certeza nos entregaria muito mais em novas temporadas. Só a decisão de aceitar viajar com Guto e Miguel, dando mais uma chance para viver da sua arte e explorar o desconhecido, é um prato cheio para um enredo super original caso a série tivesse continuidade.

Para sempre fiver

Não é uma despedida fácil, depois de uma trajetória de longos 7 anos, o elenco merecia um final grandioso e uma temporada final bem mais divulgada, mas há algo reconfortante sobre a terceira temporada: o clima de incerteza sobre a renovação levou a um último episódio com carinha de encerramento de ciclo, embora com potencial para muito mais. 


 

O último episódio é simbólico, reunindo o elenco num jantar de despedida no antigo apartamento de Lica. O roteiro é impecável e todos os personagens estão muito bem entrosados entre si, tendo uma última oportunidade de mostrar os traços bem construídos de suas personalidades. Se parece mais com um “até logo” do que com um “adeus”, mas traz um quentinho para o coração.

Mais uma vez, essas cinco atrizes brilhantes mostram a potência de uma amizade verdadeira dentro e fora de cena. “As Five” reforça a importância de ter alguém para celebrar seus momentos de alegria, mas também de um ombro amigo para quando a vida decide ser ingrata — o que, no geral, acontece com muito mais frequência. 

Como disse Benê no último capítulo da novela: “Nós vamos ser amigas para sempre, não vamos?”, o fim de “As Five” prova que sim e nos faz torcer por uma possibilidade de vermos ainda mais dessa amizade. A química entre as protagonistas deixa tudo mais verdadeiro, todo o elenco se diverte muito em cena e demonstra o orgulho de fazer parte desse projeto sempre que pode. Numa época em que há poucos conteúdos nacionais que conversem com a nossa geração, é um desperdício cancelar uma série com tanto potencial, em que tantos podem ser vistos e compreendidos. 

Para os atores, fica o desejo de que essa seja a abertura de muitas portas para novos projetos, pois todos são indescritivelmente talentosos. E ao Globoplay, um convite para repensar suas estratégias.

 

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