Lab Dicas Jornalismo Publicidade 728x90
12/02/2021 às 08h31min - Atualizada em 12/02/2021 às 08h23min

Conheça Dawit Isaak: a primeira biblioteca de livros censurados

Localizada na Suécia, a biblioteca possui um acervo com mais de 1,6 mil livros proibidos

Yngrid Alves - Editado por Gustavo Henrique Araújo
Foto: The Malmö City Archives/Reprodução: ICORN
No dia 15 de setembro de 2020, foi inaugurada a primeira biblioteca de livros proibidos no mundo. Localizada no prédio do Arquivo Geral, em Malmö, no sul da Suécia, seu acervo acumula mais de 1,6 mil livros censurados - entre eles, encontram-se obras do escritor brasileiro Paulo Coelho. O nome da biblioteca homenageia o jornalista e escritor Dawit Isaak, que se encontra preso na Eritréia sem direito a julgamento desde 2001 por fazer críticas ao regime. Isaak tem cidadania sueca, embora tenha nascido no país africano.
 
O acervo, além de livros que foram proibidos ao longo da história, também conta com músicas e peças teatrais censuradas. Obras antigas, contemporâneas e aquelas voltadas à liberdade de expressão, à censura e à democracia não ficam de fora e são abrigadas e cultivadas no espaço. Cada obra contém seu histórico de censura – quando, onde e por que foi proibida. Muitas estão disponíveis no idioma original, inglês, sueco, norueguês e dinamarquês.
 
Na seção latino-americana, encontra-se uma das obras mais famosas de Paulo Coelho, "O alquimista", a qual teve sua circulação proibida no Irã em 2011, pois o diretor de sua editora foi flagrado em um vídeo participando de um protesto contra as eleições presidenciais em junho de 2009.
 
Outras obras, como o romance "Lolita", de Vladimir Nabokov, também têm seu espaço na biblioteca. O livro foi censurado não só no Brasil, mas também em outros países, pelo teor erótico de uma atração de um professor universitário pela sua enteada de 12 anos.
 
Para os amantes da saga "Harry Potter", os livros também são encontrados em Dawit Isaak, pois foram proibidos em algumas regiões dos Estados Unidos por fazerem 'apologia à bruxaria e ao ocultismo'. Além disso, as obras foram retiradas do ambiente escolar no Canadá, por exemplo, e em outras regiões.
 
Já no âmbito musical, no site da biblioteca é possível encontrar a banda de hard rock iraniana "Confess". Em 2014, foram presos, acusados de "blasfêmia, conduta contra o regime e constituição de uma banda ilegal de death metal”. A banda foi originalmente ameaçada de pena de morte, mas em 2019 os membros da banda foram condenados a 14,5 anos de prisão cada e a 74 chicotadas.
 
Censura
 
A diretora da biblioteca, Emelie Wieslander, em entrevista à Rádio França Internacional, critica que a censura de livros não contribui para a manutenção da democracia e defende a liberdade dos indivíduos na formação de seus pensamentos. “É importante que bibliotecas sejam espaços onde as pessoas possam formar suas próprias opiniões. E para isso, as pessoas precisam de fatos. Censurar livros e ideias não fortalece a democracia – muito pelo contrário”, declarou Emelie.
 
A inauguração de uma biblioteca como essa também agrada e é admirada por profissionais da literatura. O escritor, poeta e professor de literatura Daniel Cotrim analisou a iniciativa como ‘singular’. “A importância de uma biblioteca como essa é singular. Penso que hoje, ler uma obra censurada, pode fazer com que a gente enxergue um contexto com outros olhos.”
 
Além disso, ainda julgou a censura como ‘perigosa’ e um empecilho ao conhecimento técnico. “A censura quer sempre impedir. E fazer isso com a leitura, com a literatura pode ser muito perigoso, já́ que ela é capaz de fazer as pessoas refletirem, pensarem sobre diversas questões [...] O conhecimento tem que ser para todo mundo, tem que ser democrático. E se tratando de literatura, 'é proibido proibir'", disparou ele.
 
A ditadura militar é um dos acontecimentos mais emblemáticos e representativos quando o assunto é censura. Obras como "A farsa do bode expiatório", de Luiz Maranhão Filho, por exemplo, apontava a opressão do regime e, por isso, foi proibida com a seguinte justificativa: “trata-se de uma tentativa de levar a revolução [o golpe de 64] ao descrédito, através de insinuações de que no Brasil não há liberdade”. Assim como Luiz, outros autores com produções com teor de amplificação da visão dos fatos foram e são perseguidos até os dias de hoje.
 
Literatura é conhecimento, é o iluminismo em ação, logo, é uma ameaça àqueles que desejam a manutenção das injustiças sociais. “Para o mundo, ela pode representar reflexão, choque, questionamento. Ela permite que o mundo repare naquilo que é incomum. Ela inquieta, tira da zona de conforto”, finalizou o escritor.

Link
Notícias Relacionadas »
Comentários »