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23/04/2021 às 12h37min - Atualizada em 23/04/2021 às 11h46min

Trabalho escravo contemporâneo, ainda é uma realidade vivida no Brasil

55.712 trabalhadores em condições análogas à de escravidão foram encontrados, entre os anos de 1995 a 2020. E, 53.378 trabalhadores nas mesmas condições foram resgatados nesse período

Por Ynara Mattos - Editado por Maria Paula Ramos
Foto: Divugação/Site Brasil escola - O trabalho forçado e as condições degradantes configuram escravidão.

No último dia 13 do mês de abril a idosa de 74 anos, Maria das Graças Souza Rodrigues, natural do Maranhão, foi encontrada no bairro de Guaratiba no Rio de janeiro, vivendo em uma situação precária, sub-humana de sobrevivência, e de trabalho análogo ao de escravidão. Resgatada por policiais, Maria sofria maus-tratos e vivia em cárcere privado, onde dividia o espaço com 40 cachorros e 20 pombos. A família a procurava desde 1969, quando veio para o Rio de Janeiro à procura de emprego. 


Em informações divulgadas pelo site G1, a idosa relata: “Eu não saio para lugar nenhum, nenhum mesmo. Só saio para levar o lixo”. Maria foi encontrada graças a uma sobrinha que a procurava e ligou para uma vizinha para saber sobre a tia. A sobrinha denunciou o caso na 43ª DP, em Guaratiba, e ajudou os policiais a localizarem o endereço – que fica a 900 metros da delegacia.

 

 

Segundo levantamento recente feito pela Organização Internacional do trabalho (OIT), dados esclarecem que 55.712 trabalhadores em condições análogas à de escravidão foram encontrados, entre os anos de 1995 a 2020 e 53.378 trabalhadores nas mesmas condições foram resgatados nesse período. A coleta de dados vem melhorando sobretudo desde 2002, com a Lei 10.608/2002 (seguro-desemprego destinado a resgatados).

 

A Advogada Alessandra Paes, explica: 

 

“Existem diversas normas que buscam garantir aos trabalhadores condições dignas no exercício de seu ofício. A Constituição Federal, por exemplo, em seu artigo 7º, assegura um patamar civilizatório mínimo, isto é, direitos que proporcionam ao trabalhador o mínimo necessário capaz de preservar a sua dignidade, como limitação de jornada, descanso semanal remunerado, redução dos riscos inerentes ao trabalho, dentre outros. Além dela, destacam-se também a CLT – Consolidação das Leis Trabalhistas, que se aplica principalmente aos trabalhadores urbanos com vínculo empregatício, a Lei 5.889/73, para os trabalhadores rurais e a Lei Complementar 150/2015, para os empregados domésticos, todas com o intuito de proteger o trabalhador de eventuais abusos do empregador.”

 

Como surgiu a escravidão ? 

 

A escravidão chegou ao Brasil por volta da década de 1530, quando os portugueses implementaram as bases para a colonização da América Portuguesa, para atender em específico, o desejo e as exigências dos portugueses por mão de obra para o trabalho na agricultura. Esse processo se iniciou com a escravização dos indígenas, e com o passar dos séculos foram trocados pelos africanos que eram trazidos de navios negreiros da áfrica, através do tráfico de pessoas.  

 

Natanael Pires, Professor e Historiador, produziu um vídeo para o canal no YouTube Jornada na História, explicando detalhadamente sobre o assunto: “Escravidão no Brasil” 
 


E o trabalho análogo à escravidão? 

 

O trabalho análogo ao de escravidão contemporâneo, é um crime previsto no Artigo 149 da Lei nº 2.848 que fere não só a dignidade, mas, também a liberdade humana. O trabalhador passa a viver encarcerado ou em situações precárias e degradantes, ou até mesmo em uma jornada exaustiva de trabalho. 

 

“A redução de trabalhadores à condição análoga à de escravos é crime previsto no artigo 149 do Código Penal, de modo que os infratores estão sujeitos à pena de reclusão e multa. Podendo pegar pena de 2 a 8 anos de reclusão, que poderá ser aumentada de metade se for cometido contra criança ou adolescente; ou então por motivo de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou origem. Na esfera cível, podem ser obrigados a indenizar as vítimas por dano moral e material. Além disso, a pessoa jurídica poderá ser incluída na Lista Suja do Trabalho Escravo, que contém os nomes de empresas autuadas pelos fiscais do trabalho pela prática delituosa. A inclusão na Lista Suja, além de prejudicar a imagem da empresa, acarreta prejuízos como, por exemplo, a não concessão de financiamento pelos bancos públicos.” - Alerta Alessandra

 

A instituição Repórter Brasil, explica que conforme a legislação brasileira, quatro elementos podem caracterizar o trabalho escravo:  

 
  • Condições degradantes de trabalho: Quando a violação de direitos fundamentais fere a dignidade do trabalhador e coloca em risco sua saúde e sua vida. Costuma ser um conjunto de elementos irregulares, como alojamentos precários, péssima alimentação, falta de assistência médica, saneamento básico e água potável.
 
  • Jornada exaustiva: Quando o trabalhador é submetido a esforço excessivo, sobrecarga ou jornadas extremamente longas e intensas que acarretam danos à sua saúde, segurança ou mesmo risco de morte.
 
  • Trabalho Forçado: Quando a pessoa é mantida no serviço através de fraudes, isolamento geográfico, ameaças e violências físicas e psicológicas, tendo sua liberdade violada.
 
  • Servidão por dívida: Quando o trabalhador fica preso ao serviço devido a um débito ilegal (em geral, referente a gastos com transporte, alimentação, aluguel e equipamentos de trabalho, cobrados de forma abusiva e descontados diretamente de seu salário).
 

O governo brasileiro reconheceu o trabalho escravo contemporâneo em 1995. Os trabalhadores soltos são, em sua maioria, migrantes internos ou externos, que deixaram suas casas em busca de novas oportunidades de trabalho ou atraídos por falsas promessas

 

Marcas que utilizam de trabalho escravo 


O Ministério do trabalho e emprego (MTE), desenvolveu no ano de 2003 uma “Lista Suja”, na qual contém o nome de empresas e empregadores que submetem seus trabalhadores e colaboradores a situações análogas à de escravidão. Podendo permanecer na lista até 2 anos, onde nesse período a empresa é fiscalizada e monitorada, caso seja identificada uma reincidência o nome da empresa permanece no cadastro. Essa listagem é atualizada a cada 6 meses. 

 


Coca cola: A fabricante de Coca-Cola, a Spal Indústria Brasileira de Bebidas, que incorpora o grupo Fomento Econômico Mexicano (Femsa). Fundado em 30 de outubro de 1991, no México, é considerado o maior engarrafador de Coca-Cola do mundo em volume de vendas. Os seus funcionários chegavam a realizar em média 80 horas extras por mês, em casos mais extremos chegavam a 140 horas. Situações de exaustão como: esgotamento físico e emocional, estresse, colocava em risco a saúde dos trabalhadores.

 

Em entrevista ao Repórter Brasil, um motorista relatou que após encerrar o trabalho às 0h30 chegou em casa às 2h com a obrigação de retornar ao trabalho às 6h30. Ele disse aos auditores que tomou banho, jantou e ficou vendo televisão. “Se dormisse não conseguiria levantar no horário de trabalho”, informou em seu depoimento aos fiscais. “Sabia que, se não fosse trabalhar, receberia advertência no outro dia”, disse à fiscalização. 

 

Via Veneto: Dona da marca Brooksfield Donna, incluída na “lista suja” no final de 2018.  Foi o maior grupo nacional a integrar essa lista. Tinham suas roupas fabricadas por bolivianos em uma jornada de trabalho que extrapolavam às 12 horas, em um ambiente limitado, com pouca luminosidade e com cheiro forte em decorrência de falta de higiene, era assim que os trabalhadores costuravam as roupas da marca. A ONG Repórter Brasil produziu uma matéria cobrindo o processo considerado como quarteirização da mão-de-obra. 


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