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16/05/2022 às 19h29min - Atualizada em 16/05/2022 às 19h19min

Governo da Espanha apresenta projeto para licença menstrual por até três dias

Com a aprovação da medida, o país se tornará o primeiro da Europa a conceder o direito às mulheres

Aliny Bueno - Editado por Julia dos Santos
Espanha pode se tornar primeiro pais europeu a aprovar licença menstrual para as mulheres. Foto: Grinvalds por Pixabay.
Os direitos para as mulheres ganha mais um passo de avanço na Europa. Isto porque a Espanha quer apresentar um projeto que visa a "licença menstrual". Desse modo, a proposta governamental deve atender às mulheres que sofrem com sintomas graves no período do ciclo menstrual, tais como dores de cabeça e cólica abdominal que, por vezes, refletem em sua produtividade e rotina profissional. Por fim, caso o projeto seja aprovado, a Espanha se tornará o primeiro país europeu a adotar a licença menstrual. Países como Japão, Taiwan, Indonésia, Coreia do Sul e Zâmbia já autorizaram a licença menstrual para as suas populações.

Na terça-feira (17/05), a iniciativa segue para votação no Executivo do país. Proposto pela secretária de Estado da Espanha para a Igualdade, Angela Rodrigues, o texto prevê o afastamento das atividades profissionais por três dias. Em entrevista ao jornal local El Periodico, Angela ressaltou a importância da legislação.  "É importante esclarecer o que é uma menstruação dolorosa. Não estamos falando de um leve desconforto, mas de sintomas graves como diarreia, fortes dores de cabeça, febre.", esclareceu. A secretária também pontuou que, nestes casos, a licença por determinado tempo deve ser tratada como um afastamento por doença. "O mesmo deve acontecer com a menstruação, existindo a possibilidade de que, se uma mulher tiver um período muito doloroso, ela possa ficar em casa.", pontuou.

Em ressalva para que o texto seja legislado, Angela enfatizou um estudo que mostra que 53% das mulheres sofrem de menstruação dolorosa, bem como as jovens são as mais afetadas, visto que chega a atingir 74% das adolescentes. De acordo com a secretária, "Isso é inaceitável e deve causar uma reflexão para os médicos e a sociedade", concluiu a co-autora. O projeto-lei tem capítulos dedicados, também, a outros temas da saúde da mulher. O principal ponto diz respeito ao direito ao aborto para adolescentes a partir de 16 anos de idade sem o consentimento dos pais e responsáveis. Além disso, o texto estabelece que o procedimento possa ser feito em hospitais públicos.

No caso da Espanha, o aborto é legalizado desde 2010, quando passou a valer a Lei de Saúde Sexual e Reprodutiva e da Interrupção Voluntária da Gravidez. Através da "Lei de Prazos", como é conhecida, a mulher tem o direito de interromper a gestação por livre decisão, até a 14ª semana. Em casos em que a gravidez oferece risco à mãe ou anomalias ao feto, o aborto pode ser feito até a 22a. semana de gestação. Contudo, agora, o projeto se estende ao admitir que as adolescentes possam realizar o procedimento.

Sob o mesmo ponto de vista em defesa aos direitos da mulher, a proposta estabelece ainda a obrigatoriedade e distribuição de absorventes para meninas nas escolas, bem como a gratuidade do item de higiene pessoal para as mulheres mais vulneráveis, com a isenção de impostos no comércio. Em suma, o texto vai além ao propor que anticoncepcionais e pílulas do dia seguinte sejam distribuídas na rede escolar durante campanhas de saúde sexual. Todavia, o projeto passará por revisão nesta semana. Desse modo, os ministros podem rever cada ponto, de forma a analisá-los e, se necessário, alterar o texto apresentado.

Brasil: uma sociedade afetada pela pobreza menstrual
O acesso à higiene menstrual é um direito de toda pessoa que menstrual, reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como uma questão de saúde pública. Apesar dos avanços em outras partes do mundo, o Brasil parece retroceder quando se tem um cenário de precariedade enfrentado por milhares de mulheres no país. De acordo com o relatório "Livre para Menstruar", elaborado pelo movimento global Girl Up, cerca de 60 milhões de mulheres e meninas menstrual no Brasil. Porém, este não é o dado com mais evidência, se trouxer à discussão a problemática em torno do assunto menstruação para essas pessoas: A pobreza menstrual.

A pobreza menstrual se dá permeada por três aspectos fundamentais:
  1. Falta material (acesso aos itens de higiene)
  2. Privação ou falta psicossocial (interfere nas relações com o mundo para quem menstrua)
  3. Estigma em torno da menstruação (tabu social)

Em primeiro lugar, é relevante reforçar a importância da dignidade menstrual, um direito humano e de saúde pública, e que diz respeito ao acesso à higiene pessoal de forma correta e segura. Isso está relacionado ao acesso a saneamento básico, produtos higiênicos como absorventes, coletores e calcinhas menstruais, bem como papel higiênico, infraestrutura em moradias e escolas como banheiros, além do direito à informação,  em especial, a educação menstrual.

Ainda segundo o estudo, 17% das adolescentes de até 19 anos de idade não têm acesso à rede geral de distribuição de água no Brasil. Portanto, durante o ciclo menstrual, a qualidade de vida de quem menstrua pode ser prejudicada. Isto porque esse momento é caracterizado por dores físicas, enjoos entre outros sintomas. Além do mais, há o estigma que reforça a ideia de que menstruar é uma condição vergonhosa e que, portanto, deve ser encarada com constrangimento.
 
Políticas públicas de combate à pobreza menstrual no Brasil
No final de 2022, um dos assuntos mais comentados diz respeito ao veto do Presidente Jair Bolsonaro ao projeto que previa a distribuição de absorventes às estudantes de escolas públicas e de baixa renda, bem como às pessoas em situação de rua e vulnerabilidade.O projeto de lei (PL 4.968/2019), proposto pela deputada Marília Alves (PT-PE) foi aprovado pela Câmara dos Deputados em setembro de 2021. No entanto, foi apresentado o argumento de que a proposta não deixava explícita a origem orçamentária para as medidas.

Desta forma, o presidente vetou o artigo primeiro da proposta, destinado à "oferta gratuita de absorventes higiênicos femininos e outros cuidados básicos de saúde menstrual". Também, foi vetado o artigo terceiro, o qual apresentava a lista de beneficiadas. Dentre elas, estudantes de baixa renda de escolas públicas, mulheres em situação de rua e vulnerabilidade, mulheres presidiárias e mulheres internadas em unidades para cumprimento de medidas socioeducativas.

Ao barrar os pontos considerados importantes do texto do projeto, o presidente declara ser contrário a uma política de saúde pública que visa erradicar a pobreza menstrual no país e, consequentemente, fere a dignidade de meninas e mulheres que se beneficiariam das medidas. Portanto, a partir de políticas como a iniciativa da Espanha é possível considerar a dignidade menstrual como um fator essencial para que as pessoas que menstruam possam participar de maneira digna da democracia. Em síntese, o governo espanhol está a um passo de um marco histórico em sua política, ao promover a licença menstrual às mulheres.

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