Quem vê cara, não vê coração e quem acha que Studio Ghibli se resume apenas a desenhos animados sem qualquer mensagem ou paralelo com nossa realidade muito se engana.
Estamos acostumados a associar filmes animados voltados ao público infantil, nos últimos anos animações para adultos são normalmente classificadas para +16 ou até mesmo +18 devido a violência, conteúdos sexuais e eróticos, vocabulário ou por envolver gatilhos mais pesados. Quando o produto é para crianças as tramas e desenvolvimentos de personagens são voltados a mensagens para o público infantil com mensagens de amor, família e amizade, já quando o produto é para um público mais adulto não existe muito o que poderia ser aprendido, já que o foco já são pessoas com mentalidades e caráter formadas. E é neste ponto em que o Studio Ghibli faz sua diferença no mercado.
A grande crítica do filme vem pelas simbologias, o nome "Sen" pôr se for já é caracterizada por ser algo ligado a número, um valor, a cena em questão onde ocorre a troca de nomes da protagonista remete a perda de identidade de Chihiro para conseguir um trabalho, além de fazer um paralelo ao um número de valor alto que pode ser ligado ao fato de uma quantia elevada causada por seus pais terem consumido comida para os fregueses. Vale ressaltar que o consumo desenfreado dos pais da protagonista é fortemente retratado por Yubaba que os chama de porcos por comerem muito e faltando com respeito o que não é deles como se fossem animais. No filme ainda acompanhamos um espírito chamado por "Sem Rosto" que faz um paralelo com a sociedade em relação aos status financeiro, quanto mais dinheiro você tiver, mais bem tratado você será nos lugares, em contra partida temos a demonstração da situação oposta quando um personagem chega na casa de banho e ninguém o atende corretamente devido a sua aparência sem saber que ele era um deus muito importante.
Uma temática recorrentes no Studio Ghibli são as Guerras, principalmente do ponto de vista do Japão com acontecimentos históricos ocorridos no século XX, como é o caso do longa "O Túmulo dos Vagalumes" (de 1988) que conta a história de dois irmãos ainda na infância que lutam para sobreviver em meio aos bombardeios da Segunda Guerra Mundial. No filme o pai dos irmãos é convocado para servir ao exército enquanto a mãe que se encontra em estado grave de saúde, com isso Seita, um garoto de apenas 14 anos, se encontra como responsável pela sua irmã mais nova, Setsuko.
Acompanhamos Seita fazendo de tudo para salvar e salvar sua irmã a partir das dificuldades em meio a uma guerra enfrentando situações como fome, doenças, ferimentos, a morte, o luto e a falta de tempo para processar tudo o que está acontecendo sendo tão novos. Cenários de destruição passam a ser do cotidiano das crianças e a inocência dos protagonistas entra no contraste deixando o filme ainda mais marcado para todos que o assistem. A guerra faz com que o amadurecimento seja forçado a vim antes do tempo por situações extremas causado por pessoas e motivos que não possuem nenhuma ligação com os protagonistas que pagam por isso, assim como diversos inocentes.
"O Túmulo dos Vagalumes" talvez venha a se tornar pesado demais para o público infantil, mas aqui está o ponto de destaque do Studio, onde apesar das narrativas serem em desenho animado, as mensagens e os teores são para adultos já que envolvem de pautas mais intensas sobre consequências de uma guerra. Embora em "O Túmulo dos Vagalumes" as consequências da guerra sejam bastante explícitas, na obra "Vidas ao Vento" (de 2013) o impacto da guerra é mais discreto, não por não serem importantes, mas sim pelo fato de as marcas causadas pela guerra estarem internas em conflitos entre personagens.
Não apenas de assuntos pesados são tratados nas narrações dos filmes Ghibli, a cultura do Japão é sempre fortemente representada em todas as obras produzidas, mesmo naquelas em que o cenário ou contexto da história não possuem ligação direta ao país.
Em "O Conto da Princesa Kaguya" (de 2013) temos uma espécie de releitura de uma lenda do folclore japonês "O Conto do Cortador de Bambu", no filme acompanhamos a história de um homem que ao cortar um bambu encontra uma recém nascida dentro dele e resolve criá-la junto com sua esposa como se fosse sua filha biológica, mas ele acaba acreditando que a menina tinha o destino de se tornar uma princesa e com isso a família se muda para a capital para a menina encaixar nos padrões das tradições aristocráticas do Japão daquela época.
Além de trabalhar questões familiares, principalmente do ponto de vista dos pais, onde há de ter sabedoria para entender os filhos são pessoas que em algum momento terão que sair de casa e viver suas vidas longe, existe o desenvolvimento cultural dentro do filme, desses de falar sobre uma sociedade patriarcal sobre as mulheres dentro das famílias como fora delas também, os costumes e tradições de séculos atrás ainda possuem reflexos nos tempos de hoje e isso não apenas no Japão, mas como fora dele também, não apenas mostrando sobre a sociedade japonesa da época passada, mas costumes que até hoje ainda existem e "O Conto da Princesa Kaguya" não é o único filme a trabalhar com isso, pois trabalhar com aspectos culturais, tanto no passado como no presente e no futuro dentro das narrações, é uma marca do Studio Ghibli em suas produções como forma de respeito ao próprio país e como uma forma de apresentar para o mundo.
Um dos pontos fortes do Studio Ghibli são os traços e as palhetas de cores que formam os cenários de seus filmes. A natureza parece ser uma pintura que traz a suavidade e tranquilidade para quem estiver assistindo, porém nem todos os filmes do Studio trazem a temática ambiental como uma das prioridades. Nos filmes "Nausicaã do Vale do Vento" (1984) e "Princesa Mononoke" (1997) são dois dos filmes que mais valorizam a temática.
"Muitos dos meus filmes possuem protagonistas femininas fortes – meninas corajosas, autossuficientes que não pensam duas vezes antes de lutar pelo que elas acreditam do fundo do coração. Elas precisarão de um amigo, um apoiador, mas nunca um salvador. Toda mulher tem a capacidade de ser a heroína (da história) tanto quanto qualquer homem"
- A Viagem de Chihiro: Netflix
- O Conto da Princesa Kaguya: Netflix
- O Serviço de Entrega da Bruxa Kiki: Netflix
- O Túmulo dos Vagalumes: Não está disponível para streaming com um serviço de assinatura.
- Vidas ao Vento: Netflix
- Nausicaã do Vale do Vento: Netflix
- Princesa Mononoke: Netflix
O Studio Ghibli é um estúdio de animação japonês, sediado em Koganei, Tóquio. Fundado em 1985, o estúdio já produziu 21 longas de animação, sendo o primeiro O Castelo no Céu (1986) e o mais recente As Memórias de Marnie (2014). Foi fundado em 1985 por Hayao Miyazaki, Isao Takahata, Toshio Suzuki e Yasuyoshi Tokuma, logo após o sucesso de Nausicaä do Vale do Vento, no ano anterior. O estúdio lançou seu primeiro filme, O Castelo no Céu, no ano seguinte. O logotipo da empresa é o Totoro, o personagem do filme Meu Amigo Totoro, lançado em 1988.