Lab Dicas Jornalismo Publicidade 728x90
14/09/2023 às 23h01min - Atualizada em 18/09/2023 às 13h15min

Revista Anti-Horário: a solução também é notícia

Nathália Aguiar - labdicasjornalismo.com
Projeto Anti-Horário


O movimento circular de rotação num plano é chamado de “movimento horário”. Esse é o sentido em que os ponteiros dos relógios normalmente são programados para rodar: indo da direita para a esquerda, em um ciclo que segue ininterrupto, até que o aparelho pare de funcionar. Nessa situação, há duas possibilidades: livrar-se do aparelho e substituí-lo por outro ou, então, consertá-lo. Mas e se o conhecido já não for mais o caminho “certo”? 

 

Assim como um relógio segue um padrão de fábrica, as redações jornalísticas e os critérios de noticiabilidade que as permeiam estão, há anos, repetindo movimentos; dia após dia, jornal atrás de jornal. Crime, sangue, desespero. Morte, roubo, gritos silenciados. A audiência basta. Porém, e quando ela cansa? E quando isso não é mais o bastante? Os números caem; o dinheiro não deixa de entrar, mas diminui junto do interesse da população em ver as mesmas tragédias repetidas vezes. E então, a crise - e a quebra do movimento. 

 

E se a solução for mudar o padrão? E se o movimento anti-horário for a resposta para um mecanismo que já está cansado? 

 

É assim que um projeto de extensão do curso de Jornalismo da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB) parece pensar. O “Projeto Anti-Horário” existe desde 2018 e é coordenado pelo professor doutor Antonio Simões, que alinha seus trabalhos e realizações a uma abordagem que está em ascensão dentro das redações: o Jornalismo de Soluções. Para o professor Simões, especialista na área e o primeiro a lançar um livro no Brasil sobre o assunto:
 

Ele [o jornalismo de soluções] propõe uma inversão do modo de perceber a realidade, construir a notícia e apresentá-la ao público. A solução assume o protagonismo na notícia, e o problema passa a ser coadjuvante.


 Livro: Jornalismo de Soluções, 2022.

 

Indo em sentido ‘anti-horário’ (daí o nome do projeto) ao da mídia hegemônica, o projeto vem pondo seus esforços em dar visibilidade a personagens e projetos que buscam respostas para problemas sociais. No dia 30 de agosto, foi lançada a segunda edição da “Revista Anti-Horário”, a primeira revista digital brasileira focada em soluções.

 

A primeira edição havia sido lançada em abril e trabalhava materiais relacionados ao bioma Caatinga. Nesta nova edição, a temática escolhida foi o litoral. Por meio de reportagens, entrevistas, diários de bordo, crônica e poesia, a revista tenta dar visibilidade a pessoas e projetos que, sem muitos (ou nenhum) investimento, a não serem os próprios, deram início à mudança.

 

Em Baía da Traição, o Águas Potiguara põe seus esforços na recuperação do Rio do Aterro, assoreado após uma dragagem feita pelo governo nos anos 1970. Em João Pessoa, restos de peixe se tornam biojoias pelas mãos das Sereias da Penha. Nos estados de Sergipe, Rio Grande do Norte e Paraíba, o Viva o Peixe-Boi-Marinho trabalha no resgate, soltura e monitoramento de uma espécie ameaçada de extinção. Juntos, esses projetos, em pequenos, mas consideráveis passos, fazem a diferença para um planeta que precisa desesperadamente da nossa ajuda. 

 

Em entrevista ao Paraíba Ponto Cultural, a estudante de jornalismo Letícia Ferreira, integrante do projeto Anti-Horário e editora da revista, conta sobre a importância de produzir mais uma edição: “Nossa revista tem a proposta, assim como todo o projeto, de focar em soluções positivas, de trazer iniciativas que estão dando certo, principalmente dentro do nosso estado - a Paraíba - e dar voz a esses projetos que, muitas vezes, acabam não tendo espaço na mídia hegemônica.”

A produção da revista é importante não só para o jornalismo como área de estudo, mas também para aqueles que fazem/irão fazer o jornalismo acontecer. No sexto período do curso, a estudante Ana Beatriz conta como a revista afetou sua graduação:
 

Participar da produção da revista foi, na verdade, um divisor de águas para mim. Como na universidade costumamos vivenciar o jornalismo somente dentro das quatro paredes, essa produção abriu uma nova possibilidade de como eu posso viver o jornalismo - viajando, conversando, debatendo, produzindo e, principalmente, colocando em prática aquilo que antes era somente teoria. Foi tudo muito gratificante e de grande aprendizado.

 

Esta edição segue o padrão editorial da primeira, mas um adicional faz a diferença na leitura. Os “diários de bordo”, que acompanham o repórter ao fazer a coleta de dados para a realização da reportagem, são valiosos para a edição, pois o leitor se sente, verdadeiramente, parte daquela experiência e consegue adentrar mais profundamente no projeto social abordado e se sensibilizar com a história.

 

A “Revista Anti-Horário: soluções no litoral” é sensível, atual e leitura obrigatória para jornalistas, para entusiastas do jornalismo de soluções e para aqueles que acreditam que, um dia, o sussurro das respostas gritará. 


Link
Notícias Relacionadas »
Comentários »