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27/01/2024 às 16h03min - Atualizada em 27/01/2024 às 15h00min

Crônica: Alice descobre o prazer em gostar de amar

Nathália Aguiar - Edição por Mayane Humeniuk
Filme “Two Weeks In”; Foto: Divulgação.
Era domingo de Natal e o menino Jesus que a perdoasse por não focar a atenção em seu nascimento, mas Alice não pôde evitar que as lembranças da conversa que teve recentemente com sua noiva invadissem sua mente. Hoje, completavam dois dias desde que Manuela interrompeu o silêncio quase sagrado que havia se instalado na casa que dividiam e lançou para ela uma pergunta que lhe parecia piada.
Você gosta de mim ou se acostumou com a minha presença?
Ora, gostar. Alice a amava, era claro. Como podia ser questionada sobre isso depois de tudo que ambas passaram para estarem juntas?
Vendo a confusão no rosto de sua noiva, Manuela explicou:

Não estou falando sobre amor, mas sim sobre gostar. Você avisaria se não gostasse mais de mim?
Alice pensou sobre o assunto. Nunca, em toda sua vida, havia pensado na diferença entre os sentimentos, mas sabia que sentia ambos em quantidade que não sabia explicar por aquela mulher que, agora, a encarava esperando por uma resposta que era tão óbvia.

Para deixar de gostar de você, eu preciso deixar de te amar e isso é impossível, anjo. O amor é maior que o gostar respondeu, satisfeita consigo mesma.
Nada impede que você continue amando uma pessoa que não gosta mais.
A frase dita suavemente encontrou em Alice aspereza. Ela pensou sobre o assunto. De fato, não gostava mais de algumas pessoas, mas isso não a impedia de as amar... Só não fazia mais sentido para ela manter em sua vida relações de cansaço, pelo motivo que fosse. É, talvez estivesse errada, talvez o que faça que as relações continuem seja o prazer em gostar do outro. Então pensou na mulher à sua frente. Pensou que a amava. E que todos os dias aprendia como a amar melhor, mas que também precisava manter vivo o que a fez gostar de Manuela.
Suspirou, como quem entende uma operação difícil na prova, e sorriu.

Eu gostei de você antes de te amar, Manuela, e continuo gostando todos os dias desde então. Eu me acostumei com sua presença, mas isso não impede que eu torça por ela e sinta as malditas borboletas no estômago sempre que está perto de você chegar na nossa casa. E eu gosto muito de gostar disso.
Manuela sorriu. Enfim, Alice havia acertado a resposta. Então, sem dizer mais nada, se aproximou da sua noiva e se embrenhou em seu abraço, que a acolheu como casa.

Gosto disso também brincou Alice, e as duas riram. O assunto, por ora, acabava ali.
A memória encerrou e Alice prestou atenção novamente ao momento atual. Ainda estava em um círculo ao redor da mesa, segurando a mão das suas tias, esperando que a oração que todos os anos antecedia a ceia se encerrasse. Ah, essa era a hora que fazia as tais borboletas em seu estômago aparecerem de novo. Ou podia ser simplesmente fome...
"Amém", escutou em uma só voz.
Aleluia, havia acabado. Deus a perdoasse, pois ela o amava, mas gostava ainda mais de encher sua barriga.

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