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30/04/2024 às 01h41min - Atualizada em 30/04/2024 às 00h36min

A Volta ao Mundo em 8 Filmes

Produções estrangeiras para se aventurar no vasto e extraordinário mundo das legendas

Maria Eduarda Torres Cavalcanti - Revisado por Paola Pedro
(Foto: Reprodução/ Site Wanna Be Nerd)

“Um bom inglês não brinca jamais quando se trata de uma coisa tão séria quanto uma aposta”, disparou Phileas Fogg, excêntrico cavalheiro inglês, para os companheiros de jogatina que o cercavam. Minutos antes, o protagonista do romance de Júlio Verne, publicado em 1873, havia posto seu juízo e parte de sua fortuna à prova numa convicção espantosa: a de que conseguiria dar a volta ao mundo em 80 dias. Acompanhado de Passepartout, seu fiel escudeiro, Fogg parte determinado a provar o que, até então, se julgava inalcançável.

 

Ainda que fosse um homem de muita fé na engenhosidade humana, Phileas Fogg jamais imaginara que sua aventura mirabolante se tornaria crível, mais de cem anos depois: tornou-se, enfim, possível passear pelo globo — seja numa grande sala escura ou no conforto de um sofá acolchoado — em um ou dois cliques. 

 

A indústria cinematográfica norte-americana, que sempre recebera forte investimento do Estado, é um dos mercados mais lucrativos e expansivos em todo o mundo. O cinema hollywoodiano exerceu e exerce uma influência esmagadora no imaginário e consumo global que permanece até hoje. Mesmo sendo responsável por feitos de destaque na forma como se concebe e se usufrui da sétima arte, o grande ‘credor’ do cinema ocidental fez pagar — às minorias políticas e aos países ‘de fora’ do circuito tradicional — um preço ainda mais custoso que seus orçamentos milionários: a disseminação de preconceitos e caricaturas do estrangeiro. 

 

Embranquecidos. Ridicularizados. Marginalizados. Assim foram pintados indivíduos e nações fora da vivência e da conveniência do homem branco norte-americano, desde os primórdios da produção hollywoodiana. Da fetichização de mulheres — latinas, negras e asiáticas — à demonização de povos árabes, os estereótipos propagados nas telonas, ainda que, à primeira vista, pareçam “inofensivos”, reproduzem uma forte ideologia de submissão e retrocesso do “outro”, a quem recai os mesmos velhos destinos: o de buscar o ‘sonho americano’ ou viver à margem da sociedade e dos países ditos de ‘primeiro mundo’. 

 

A hegemonia da indústria estadunidense — amparada, de forma contraditória, pela globalização —, no entanto, vem sendo fragilizada com o crescimento de políticas de incentivo à produção audiovisual fora do eixo hollywoodiano e a chegada das plataformas de streaming, que possibilitaram uma abertura notável para o cinema estrangeiro.

 

Confira, abaixo, uma lista de títulos para expandir seu repertório e conhecer outras formas de fazer Cinema: 

 

1 - Brasil: Paloma (2022)

Direção: Marcelo Gomes

Gênero: Drama

Onde assistir: Globoplay


 

Nas miudezas de Saloá, município localizado no Agreste Pernambucano, uma agricultora de mamão pedia para costurar seu nome em um véu, na esperança de ser a próxima a realizar seu grande sonho: casar na igreja de vestido branco, véu e grinalda. Esse desejo, comum a tantas mulheres, é encarado com temor pelos moradores quando se trata de Paloma (Kika Sena), uma mulher transexual. A recusa do padre em realizar a cerimônia obriga Paloma a enfrentar a sociedade rural, mas ela está determinada a não deixar nada abalar sua fé. 

 

Baseado numa história real, o longa-metragem de Marcelo Gomes nos entrega mais que belíssimas fotografias, artifícios inteligentes e uma atuação exuberante de Kika Sena, que dá vida a protagonista: em tela, pinta-se um Brasil que sangra, mas que mesmo à duras perdas, resiste, pois enquanto houver sonho, haverá vida. 

 

2 - Argentina: Relatos Selvagens (2014)

Direção: Damián Szifron 

Gênero: Comédia/Thriller

Onde assistir: Max

 

Dirigido por Damián Szifron, o longa-metragem argentino se comporta como uma série episódica ao reunir seis histórias em que os personagens — moralmente questionáveis e perversamente divertidos — têm seus nervos postos à prova em situações cotidianas, que os levam aos mais inusitados desfechos. Assistir a "Relatos Selvagens" é quase como estar diante de um trem descarrilando: com reações implodindo e explodindo numa crescente atmosfera de fúria, mas que não perde os trilhos da qualidade narrativa.


A mescla certeira de humor e violência de Szifron nos lembra um pouco da filmografia de Pedro Almodóvar: nome que voltará a aparecer nesta lista logo em breve.  

 

3 - Índia: Quando Surge o Amor (1998)

Direção: Karan Johar

Gênero: Romance/Musical

Onde assistir: Netflix

 

Para os amantes de musical, aqui está uma excelente pedida! Na película do cineasta indiano, Karan Johar, acompanhamos a história da garotinha Anjali (Sana Saeed) que, em seu aniversário de oito anos, recebe uma carta da falecida mãe, com um pedido: o de trazer de volta para vida de seu pai (Shah Rukh), uma grande amiga — que, curiosamente, tem o mesmo nome que o seu. 

 

Mesmo com a duração de 185 minutos, a obra nos encanta do início ao fim, com números musicais divertidos, personagens carismáticos e momentos repletos de muita doçura e sensibilidade. 

 

4 - Coreia do Sul: Rastros de um Sequestro (2017)

Direção: Jang Hang-jun

Gênero: Suspense

Onde assistir: Netflix

 

O filho mais velho de uma família amorosa é raptado e retorna, depois de 19 dias, totalmente diferente do que era e sem nenhuma memória do ocorrido. Então, seu irmão caçula, Jin-seok (Kang Ha-neul), tenta descobrir a verdade sobre seu desaparecimento. À medida que Jin-seok e nós, espectadores, nos aproximamos dos fatos, somos engolidos por uma atmosfera de tensão que só deixa de nos perseguir quando sobem os créditos. 

 

Rastros de um sequestro é daquelas obras que, sorrateiramente, domina nossos sentidos e é capaz de continuar nos surpreendendo, pela inteligência e pela execução, cada vez que lembramos dela. 

 

5 - Nigéria: Cinquentonas (2015)
Direção: Biyi Bandele

Gênero: Drama

Onde assistir: Netflix

 

O longa-metragem assinado por Biyi Bandele, romancista e cineasta nigeriano, nos conduz à vida e aos dilemas das amigas Elizabeth (Irete Doyle), Maria (Omoni Oboli), Tola (Dakore Akende) e Kate (Nse Ikpe Etim): quatro mulheres nigerianas na faixa dos cinquenta anos. A trama, que tanto nos lembra de outras histórias que abraçam o realismo cotidiano, nos presenteia com uma reviravolta surpreendente e uma representação carismática e necessária de mulheres negras fora de posições subalternas. 

 

6 - Noruega: A Pior Pessoa do Mundo (2021)

Direção: Joachim Trier

Gênero: Drama 

Onde assistir: Prime Video

 

Parte de uma trilogia temática em Oslon, povoada de personagens intrigantes e intranquilos, Joachim Trier nos mergulha nas dores e dilemas de Julie — interpretada pela excelentíssima Renate Reinsve — que se vê, aos trinta anos, imersa em uma torrente de incertezas. A protagonista pula de emprego em emprego, de relacionamento em relacionamento, na tentativa desesperada de encontrar verdades sobre si mesma. 

 

Narrado de forma episódica — condensando, em uma única película, quatro anos de vida da personagem — o cineasta noruguês nos arrebata com uma história sóbria, mas que não deixa de ser ligeiramente agridoce. A pior pessoa do mundo é uma obra que, em suma, expressa muito mais do que é verbalizado, já que as vulnerabilidades de Julie também refletem as nossas. 

 

7- Espanha: Volver (2006)

Direção: Pedro Almodóvar

Gênero: Comédia/Thriller

Onde assistir: Netflix

 

Esta é mais uma das obras em que Pedro Almodóvar — figurão do melodrama espanhol, que dispensa apresentações  — entrega, ao público, seu bem-humorado universo povoado de mulheres transgressoras, dramas cotidianos e que pinta, mais uma vez, suas personagens de um vermelho vibrante. Na trama, acompanhamos Raimunda (Penélope Cruz), sua filha Paula e a irmã Sole (Lola Dueñas), que retornam à cidade natal após a morte de uma tia. O que parece, à primeira vista, uma história comum, ganha suas nuances almodovarianas quando Sole é surpreendida com o espírito de Irene, sua falecida mãe, que retorna para resolver questões do passado. 

 

A trama, que explora as dores e a sororidade que atravessa as mulheres do vilarejo de La Mancha — e que tanto nos marcam, como um todo — também nos entrega um drama familiar, que nos comove ao trazer a ideia da morte como presença que deixa vestígios: estes, capazes de semear angústia ou aconchego. 

 

8 - França: Amor (2012)

Direção: Michael Haneke

Gênero: Drama/Romance

Onde assistir: Prime Video

 

Vencedor da Palma de Ouro e Oscar de Melhor Filme Internacional, em 2013, Michael Haneke, diretor austríaco, nos transporta para dentro de um espaçoso apartamento parisiense onde vivem Georges (Jean Louis-Trintignant) e Anne (Emmanuelle Riva), um casal de aposentados que compartilham o amor pela arte. O filme, enganosamente inofensivo, firma sua força logo nas primeiras cenas: somos chacoalhados pela morte de Anne para, depois, revirarmos as lembranças de seu esposo e do amor genuíno que resistiu às ruínas: do tempo e da doença. 

 

O amor se despede de Georges num suspiro sôfrego, mas que logo se transforma em silêncio: cortante e, ainda assim, mais valioso que uma vida em tons de cinza. Pois, como Clarice dissera, certa vez: amar os outros é, sobretudo, salvação individual, pois “ninguém estará perdido se der amor e às vezes recebê-lo em troca”

 

Com o mercado mais fatiado e países de fora do circuito tradicional tendo seus momentos de prestígio internacional, torna-se cada vez mais urgente a necessidade de descolonizar olhares: sobre o outro e sobre nós mesmos, enquanto parte de uma nação que exala, mesmo a duras penas, a riqueza e a vivacidade de sua cultura.

 

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