“Na escola
em casa
na cozinha
perguntei pra minha mãe:
– o que é morrer?
ela estava fritando bife pro almoço.
– o bife
é morrer, porque morrer é não poder mais escolher o que farão com a sua carne.
quando estamos vivos, muitas vezes também não escolhemos, mas tentamos.
almoçamos a morte e foi calado.
enquanto minha mãe lavava louça fui até a casa do seu luís às escondidas, mas não exatamente
acho que minha mãe ouviu
a porta batendo e que era eu
saindo com os meus 8 anos atravessando a rua olhando
pros 2 lados que meu pai me ensinou cuidado
e batendo na casa do seu luís
pra perguntar. minha mãe deixou eu ir, deve ser
porque morreu uma menina de oito anos e isso
transformou ter a minha idade em ser adulta."
A partir do segundo capítulo, "Aos 17", a história prossegue mais temperada e a voz da personagem alcança naturalidade. É quando o contexto vivido passa a ser marcado pelas suas descobertas sexuais, que resulta em um estupro.
"aproveito e tiro uma foto
de dentro da minha cabeça. daqui um tempo
olharei para ela e
ficarei triste
por ser eu mesma
e não haver outra saída possível pra deixar de ser eu e
ainda assim seguir vivendo."
O romance de Aline Bei é caracterizado pela perda, não só de fé, esperança e inocência, mas também companhias queridas. A cada capítulo, a personagem através de sua força e superação, diz que na vida sempre existirá saídas até se completar um ciclo. Embora exista um fio de fé nos capítulos, não é uma leitura leve. A estratégia narrativa de Bei, é levar o leitor às seguintes perguntas: até quando essa mulher irá suportar o fardo pesado da vida? O texto é uma poesia ou uma prosa?
Foto divulgação de Aline Bei
É correto afirmar que as frases curtas, não pontuadas e os espaços entre todas elas, formam um texto fluido, quase impossível de abandonar. Palavras escritas com tamanha delicadeza e beleza, que sem dúvida alguma pode-se afirmar que o surgimento de Bei é um reforço benéfico para a nossa literatura brasileira contemporânea.