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05/02/2021 às 18h13min - Atualizada em 05/02/2021 às 17h42min

Após Argentina aprovar a descriminalização do aborto, debates são gerados por todo o mundo

Ministério da saúde mostra que, a cada dois dias, uma brasileira pobre morre vítima do aborto inseguro. É a quinta causa de morte materna no país

Por Ynara Mattos - Editado por Camilla Soares
Nayane Ramalho; Bruna Richter e Ayna Seixas.
Foto: Agustin Marcarian/Reuters - Divulgação: G1/OGlobo Manifestantes pró-aborto participam do ato em frente ao senado da Argentina pela legalização do aborto.

Em dezembro do último ano, o Senado da Argentina (País da América do Sul, vizinho ao Brasil) aprovou o projeto de lei que permite a legalização do aborto no país, até a 14° semana de gestação, após isso só irá ser permitido a interrupção da gravidez em casos de estupro, má formação do feto ou risco de vida que comprometem a saúde da gestante.

 

Foram décadas de debates, desde o início da década de 1990, um grupo feminista tentou emplacar no congresso da Argentina um projeto de lei para descriminalizar o aborto, mas não teve êxito. Vários projetos de lei tramitaram no Congresso argentino desde então, tendo em 2018, alcançado força suficiente para promover a discussão entre os congressistas, o que somente obteve êxito em 2020, com o projeto apresentado pelo governo do presidente Alberto Fernández. 

 

A Igreja Católica já não tem tanto poder sobre a Argentina como há 50 anos, entretanto, o cenário atual se tornou diferenciado porque o Papa Francisco é argentino, e se manifestou pró vida. O líder religioso se certificou de que poderia fazer a sua parte, ligou para alguns deputados para pressioná-los a votar contra a aprovação do projeto, contudo não obteve resultados, e a descriminalização do aborto foi aprovada. (Informações divulgadas pela Globo News)

 

O Brasil possui um sistema repressivo, onde a criminalização do aborto provocado está longe de evitar que as mulheres abortem, em verdade, o que se tem é a confirmação das desigualdades vivenciadas pelas mulheres, especialmente as mais carentes, sem mencionar sequer o grande números de mulheres que ficam com sequelas dos abortos realizados clandestinamente ou mesmo as que acabam vindo à óbito por não terem o atendimento médico adequado.

 

Nayane Ramalho, Advogada OAB/PB, explica:
 

"É importante enfatizar que a questão do aborto deve ser tratada como uma questão de saúde pública. A legalização do aborto é para além de uma causa individual, mas de saúde coletiva, é deixar de penalizar e expor de forma desproporcional as mulheres brasileiras a riscos desnecessários. Na contramão de entender o aborto como uma questão de saúde pública, a grande maioria dos projetos apresentados no Congresso, especialmente em 2020, visam restringir o direito do aborto".

 

“O aborto provocado (ou induzido) ainda é considerado crime contra a vida no Brasil. Foi inserido no ordenamento jurídico em 1940, tendo sido recepcionado pela Constituição Federal. As condutas são tipificadas nos artigos 124 a 128 do Código Penal. As penas previstas variam de um ano de detenção, podendo chegar até dez anos de reclusão, a depender da hipótese”.

 

A Advogada explica ainda que: “Fazer um aborto induzido pode acarretar em detenção de um a três anos para a mãe que causar o aborto ou que dê permissão para que outra pessoa o cometa. Neste último caso, a pessoa que realizou o procedimento pode pegar de um a quatro anos de prisão. Quando o aborto induzido é provocado sem o conscentimento da mãe, a pessoa que o provocou pode pegar de três a dez anos de reclusão”. 

 

No Brasil, o aborto provocado só é permitido quando há risco de morte para a gestante, quando a gravidez resulta de um estupro ou quando o feto é anencéfalo. Nestas hipóteses, as gestantes poderão obter gratuitamente o aborto legal através do SUS (Sistema Único de Saúde).  

 

Países onde o aborto é permitido em qualquer instância:

 

A maioria dos países da Europa legalizou o aborto há algumas décadas, como a Inglaterra (1969), França (1975), Itália (1978) e Portugal (2007). A Irlanda do Norte passou a permiti-lo só em outubro de 2019. Os Estados Unidos legalizaram a prática em 1973, o Canadá em 1969, Nova Zelândia em 1977, Tunísia em 1973, África do Sul em 1997 e Moçambique em 2014. 

 

Os países vizinhos ao Brasil, da América do Sul, Argentina, Uruguai, Guiana e Guiana Francesa permitem a interrupção voluntária da gravidez de acordo com a vontade da mulher. Na América Latina, o aborto também é legalizado em Cuba e Porto Rico. 

 

 

Segundo levantamentos e estatísticas realizados pelo Site Worldometers em tempo real, cerca de 3.948.296 abortos já foram realizados no ano de 2021, esse número já superou os de mortos pelo novo coronavírus durante toda a pandemia, que segundo o Site OPAN (Organização Pan-Americana da saúde) já chega a 2.232.223 mortes. 

Como a sociedade enxerga o aborto ?
 

Apesar de o Brasil ser considerado um estado laico desde 1890, “A legalização do aborto” sofre muita pressão religiosa. É um assunto polêmico, delicado de ser tratado, muitas vezes considerado como um tabu. A temática gera debates dividindo a sociedade em os que são pró-aborto (a favor do aborto), e os que são pró-vida (contra o aborto). 

 

Dados divulgados pela Uol Universa, mostram que 88% das mulheres que já recorreram ao aborto possuem uma religião. O fato é que nem a criminalização nem a culpa impedem a mulher que quer abortar. Ministério da saúde mostra que, a cada dois dias, uma brasileira pobre morre vítima do aborto inseguro. É a quinta causa de morte materna no país. 

 

 
 

A Associação Brazil 4 life (Brasil pela vida) é uma instituição cristã evangélica, que abre núcleos de apoio à mulheres com gravidez indesejada a entenderem o valor da vida. Capacitam diversos voluntários através de treinamentos com conselheiras, diretores, palestrantes em escolas e influenciadores digitais. Tem como missão a luta pela vida desde o ventre materno. Iná Braniff, idealizadora do Brazil 4 Life, aos 12 anos percebeu ter um chamado, um talento para lutar pela vida dos bebês ainda no ventre materno. Anos depois ao ir morar nos Estados Unidos iniciou a luta pela causa pró-vida na cidade onde residia. Em 2000, no Brasil abriu o primeiro núcleo de apoio a grávidas na cidade de São Paulo e à partir de 2008 junto com sua irmã e coordenadora, Vera Ribeiro, passaram a capacitar voluntários que entendem que uma criança no ventre já é um ser humano, ele não se torna uma criança ao nascer, já é humano desde o início. Hoje a associação Brazil 4 Life além do Brasil, atua nos EUA e Angola. 

 

Ayna Seixas, Pós graduada em análise criminal e Conselheira voluntária da associação Brazil 4 Life, afirma:
 

“O principal objetivo é mostrar para essas mamães que elas já são mães, elas escolhem se querem ser mães de bebês vivos ou de bebês mortos. Através de aconselhamento, atendimento psicológico, apoio com cestas básicas, enxovais, alimentação, entre outros. As mulheres se sentem amadas e valorizadas e aprendem a valorizarem também seus bebês. Temos um Website, Facebook e Instagram Brazil 4 life International, onde pessoas têm acesso às informações necessárias que precisarem e também telefone e email para contato”. 

 

A associação Brazil 4 Life trabalha com muitas mulheres de diferentes backgrounds. Muitas histórias em que abusos estão presentes, assim como questões psicológicas e emocionais. Todas essas questões há profissionais como assistentes sociais, psicólogas e psicanalistas que são treinados a fim de seguir o mesmo padrão de qualidade encontrado em todos os núcleos da associação. 

 

“Trabalhar muitas vezes com tantas vidas despedaçadas não é fácil mas é compensador. Acredito que cada ser humano é único, é um mundo, por isso todas as experiências são desafiadoras, não existe uma maior ou menor. O que existe é uma alma pedindo socorro”. - Compartilha a professora Ayna

 

Ayna Reitera:
 

“Condenamos todo tipo de abuso a qualquer ser humano. Abuso é crime e o abusador deve ser penalizado pelas autoridades competentes. Sentimos compaixão e respeitamos a mulher vítima desse crime absurdo onde a vítima sofre humilhação, sensação de impotência, terror entre muitas outras coisas indescritíveis. No entanto, uma mulher, vítima de abuso, quando nos procura, tem uma equipe muito competente e bem treinada para auxiliá-la, como já foi dito em questões anteriores. O que é preocupante é quando, além de sofrer pelo abuso, essa mulher também sofrer pela síndrome do aborto. Isso é grave! Não existe liberdade em uma mente aprisionada por emoções devastadoras. Essa mulher merece a chance de resgatar a vida dela assim como o bebê que está no ventre, também um ser humano, merece a mesma oportunidade. O aborto faz a mãe e o feto vítimas dele. Enfim, interromper uma gestação não deve ser uma escolha. Existe a adoção!”

 


Aborto x Saúde:
 

Bruna Richter, Psicóloga, Aponta sobre os riscos que o aborto pode gerar na saúde da mulher:
 

“Como a sociedade em geral condena o aborto, não é infrequente que o sujeito que a operou tenha sentimentos negativos a seu respeito, tais como: tristeza, vergonha ou angustia. É frequente que haja também embotamento emocional, pesadelos frequentes relacionados a esse contexto e comportamentos de autopunição. O estigma que se entranha de forma quase indissolúvel é o da culpa, reforçado pela população que censura o ato”.

 

Hoje a sociedade se encontra dividida entre os que são a favor dessa prática e a enxergam como uma forma de liberdade da mulher, e os que pensam que seria muito mais fácil prevenir uma gravidez, do que interrompê-la. 

 

“Apesar de haver posições divergentes e polêmicas de acordo com o ponto de vista de quem se apropria do discurso acerca da descriminalização, a ausência de acolhimento, de apoio e de compreensão podem ser decisivas no enfrentamento de uma fase delicada e dolorosa por si só. Em meio a tantas disparidades sociodemográficas, principalmente entre os mais jovens com baixa escolaridade, prevalece a falta de conhecimento sobre métodos contraceptivos, se perpetuam as formas irregulares de uso dos mesmos e ainda há falta de educação visando um planejamento familiar. Portanto, o suporte psicossocial em relação à saúde da mulher se faz muito necessário. Muitas pessoas perdem a vida em decorrência de complicações provenientes de procedimentos clandestinos. A proibição não faz com que os índices de abortos diminuam. Pelo contrário, sua prevalência é abrandada em países que o descriminalizam e investem em educação sexual”. - Aponta a Psicóloga

 

Bruna declara ainda:
 

“O abuso sexual é um crime hediondo. Suas consequências deixam marcas profundas tanto físicas como emocionais em suas vítimas. A mulher abusada, quando se vê com uma gravidez que é produto desse ato, pode sentir-se mais colapsada. Nesse caso, o aborto é consentido, por lei, pela justiça. Além de sequelas físicas, por ser um procedimento operado de forma clandestina em nosso país, o dano à saúde mental pode ser gigantesco. Esse aspecto psicológico é fortemente afetado pelo preconceito estrutural entranhado em nossa cultura. Questões religiosas, proibições legais e convencionalismos podem potencializar as reminiscências de métodos abortivos. De modo semelhante, uma gravidez indesejada levada até o final por algum tipo de coação, pode impactar de maneira extremamente negativa a vida de quem se percebe obrigada a mantê-la, em detrimento de seu desejo”.

 

 
 

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