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03/04/2021 às 23h42min - Atualizada em 03/04/2021 às 23h34min

Estuprar mulher que se embriagou voluntariamente não é crime em Minnesota EUA

Até o ano de 1988, o fato de o marido querer ter relações sexuais com a esposa e ela se recusar, e mesmo assim ele cometer o ato, ainda assim não seria crime

Rute Moraes - Editor: Ronerson Pinheiro
Foto: Tribunal Superior de Minnesota, EUA - Reprodução: Jonathunder/Wikipédia

 

 

O Tribunal Superior de Minnesota (EUA), anulou a condenação de um homem que se aproveitou da embriaguez de uma mulher para estuprá-la, sob o argumento de que ela não foi forçada a se embriagar. Os juízes da corte argumentaram que a definição de “mentalmente incapacitado (a)”, não inclui vítimas que se drogaram ou sem embriagaram voluntariamente.

O caso aconteceu em maio de 2017 quando François Khalil, encontrou a vítima juntamente com uma amiga em frente a um bar no bairro de Dinkytown (Minneapolis). A mulher (vítima) que teve a identidade preservada, bebeu cinco doses de vodka e ingeriu um narcótico receitado por seu médico. O algoz convidou a vítima e a amiga para uma festa e as duas aceitaram.

Khalil e dois amigos as levaram para uma residência na cidade onde não havia festa alguma. A moça se deixou cair no sofá, perdendo a consciência momentaneamente. Entretanto, acordou a tempo de perceber que estava sendo estuprada pelo agressor.

Em 2019, o Tribunal do Júri condenou o homem por crime contra a liberdade sexual, de terceiro grau, envolvendo uma vítima que estava incapacitada. Khalil então foi sentenciado a cinco anos de prisão.

Atualmente em 2021, o Tribunal Superior do estado anulou a condenação, argumentando que a definição da vítima estar “mentalmente incapacitada” só se aplica quando a pessoa ingeriu bebida alcoólica ou drogas contra a sua vontade. Alguns deputados buscar legalizar uma PL (Projeto de Lei) que caracteriza o estupro também nessas situações.

Para o advogado criminalista, Lincoln Rocha, esse Projeto de Lei faz um paralelo com a Lei brasileira que enquadra o crime de estupro: “O PL busca caracterizar que independentemente de a embriaguez ser voluntária ou não, que o estupro seja configurado. O estupro de vulnerável na legislação brasileira é previsto no artigo 217 do código penal, aqui não se analisa se a pessoa se embriagou voluntariamente ou não, mas sim se houve o consentimento. Pois esse fator independe de a vítima estar embriagada ou não”, diz.

Segundo o criminalista, esse fator classifica a legislação brasileira como moderna nesse sentido. “Ela está adequada aos padrões internacionais, principalmente com os mecanismos dos direitos humanos trazidos pela ONU, na declaração dos direitos universais”, enfatiza.

Lincoln ressalta que caso esse PL seja aprovado, isso não é garantia de que o réu seja impune, sendo necessário avaliar como o sistema americano se comporta nesse sentido, “No Brasil, temos uma regra no qual a norma posterior ao fato não se aplica, com a exceção de ser benéfica ao réu. Portanto se hoje uma pessoa tem uma conduta que até então não é considerada crime, e tempos depois a mesma atitude passa a ser crime, no Brasil essa Lei não enquadra o comportamento realizado antes da Lei. Nesse caso é necessário avaliar o código Penal americano”, explica.

A atitude do Tribunal do Júri americano gerou desconforto de algumas pessoas nas redes sociais, inclusive aqui no Brasil, caracterizando a decisão, como: “sexista, machista, preconceituoso entre outros”. Mas calma, embora nossa legislação seja considerada “moderna”, nem sempre foi assim. 

Até o ano de 1988, o fato de o marido querer ter relações sexuais com a esposa e ela se recusar, e mesmo assim ele cometer o ato, ainda assim não seria crime. Essa conduta era pautada no pressuposto de que a mulher deveria se submeter a todas as vontades do homem. Esse é o chamado “estupro marital” que após essa data passou a ser considerado crime.

O Atentado Violento ao Pudor (AVP) consiste em constranger alguém a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal, previsto no Art. 214.  Apesar dos crimes de estupro e AVP serem muito parecidos, pois protegem o mesmo bem jurídico (liberdade sexual), nunca houve, discussão a respeito da possibilidade ou não do marido praticar AVP.

 

 

 

O fato é que existe a possibilidade de o marido praticar atentado violento ao pudor contra a própria esposa, já que o casamento não traz a obrigação de se realizar atos sexuais. Dessa forma, o marido que obriga a esposa praticar atos diversos da conjunção carnal deve sempre responder pelo crime do artigo 214, Código Penal (atentado violento ao pudor).

 

 

 

Para a criminalista, Ana Carolina Badaró, o direito penal acompanha as relações sociais. “A questão das obrigações da mulher no casamento era um reflexo de uma sociedade sexista. A nossa Lei Civil e Penal reiterou a situação de subordinação da mulher, e com o tempo, conseguimos perceber o progresso da Lei em relação a isso”, afirma.

 

 

 

Badaró ressalta, “Existe estupro dentro de casamentos e namoros, e é crime! O estupro começa onde o consentimento termina. Pode ser em quarto de motel, onde a vítima tenha ido por livre e espontânea vontade, ou em uma residência na qual reside o marido há trinta anos, se não há consentimento, ocorre estupro!”, conclui.

 

 

 

Um dos grandes problemas continua sendo a desinformação. Muitas mulheres acreditam que devem manter relações sexuais com seus parceiros mesmo não possuindo vontade, somente pelo fato de ser casada ou estar dentro de um relacionamento. Por outro lado, não adianta olharmos para a situação de Minnesota e achar aquela sociedade retrógrada, sendo que no Brasil, vivenciamos situações do mesmo nível de gravidade.


Editora-chefe: Lavínia Carvalho

 

 

 

 

 

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