"Desgraçadamente, com todos esses raciocínios, ela descobriu que para os sentimentos tenazes oito anos pouco mais são do que nada."
Esse convício traz à tona inúmeras realidades, e a que mais se destaca é a ascensão social através do “trabalho”, especialmente pela Marinha Inglesa. Sir Walter Elliot, pai de Anne, um baronete narcisista com problemas financeiros em função do consumo em excesso, é o próprio retrato da nobreza rural que prezava pela riqueza de berço. Ele faz inúmeras críticas aos oficiais – em aparência e status – e considera ofensivo dividir os espaços sociais com essas pessoas.
Persuasão não é apenas o título desse livro. É a palavra presente em toda a obra, que coloca várias perspectivas e circunstâncias em atrito, levando o leitor a se questionar: até onde a influência de terceiros deve interferir na vida pessoal de alguém? A Persuasão é o ponto de partida deste romance, quando Anne decide seguir a palavra de alguém que considera parte de sua família, mas também caminha estreitamente por várias personagens; a todo momento alguém parece fazer um jogo em que um induz o outro, tanto em escolhas como em comportamento.
Sob o olhar da adorável Anne, Jane Austen, é claro, não abre mão de caricaturar as personagens e ironizar suas atitudes e comportamentos, a futilidade das irmãs Elliot e a vaidade do patriarca da família. Tudo isso é construído a partir do contexto social que a própria Austen viveu, ou seja, não poderia ser nos entregues retrato mais fiel das condutas daquela hipócrita sociedade.
"Persuasão", no entanto, não é apenas sobre esse jogo de induções: é uma obra que envolve, especialmente porque a narrativa permite esse mergulho nos sentimentos de Anne e nos deixa à espera do romance. Inclusive, eu diria que é um romance de espera, porque tanto Anne quanto Frederick, apesar de agora maduros, vão ao longo da história lidando com mágoas, incertezas, consequências do tempo e até mesmo orgulho.
Para os leitores de romances mais contemporâneos e com um pouco menos de paciência, talvez este não seja o romance ideal. Mas a verdade é que o percurso de Anne e Frederick não é contado em toques, abraços, quiçá beijos, mas na sutileza dos detalhes, dos olhares, das palavras ditas – como na épica carta do capitão – e das não ditas.
A última obra de Austen é um prato cheio de todas as qualidades de suas obras, mas com um pequeno gosto de despedida. A razão de "Persuasão" não ser tão citado quanto "Orgulho e preconceito" está fora do meu (leigo) entendimento, mas de forma alguma deveria ser desacreditado. É o ápice do que eu, de forma muito ousada, acredito ser o lado agridoce de Jane Austen.