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12/05/2021 às 20h50min - Atualizada em 12/05/2021 às 20h38min

Crônica: pratos familiares e memória afetiva

No isolamento social, a memória vinda das típicas refeições familiares se torna um acalento à alma

Hellen Almeida - Editado por Andrieli Torres
Ilustração: Reprodução/Freepik

Pois é, o dia das mães foi sinônimo de felicidade para uns, tristeza para outros (meu caso), em toda a minha vida, esse é o primeiro dia das mães que passo distante da minha (maldita pandemia), ao menos me sinto conectada a ela ao cozinhar... Perdão, não compreende, certo? Vamos do início.

Prazer, me chamo Ariel – como a princesa, não o sabão em pó –, tenho 22 anos, há pouco tempo saí da minha cidade natal para seguir meu sonho de ser jornalista (o que acabou me distanciando de minha família). 

Minha colega de classe, Clara, já escreveu por aqui ("Aniversários na pandemia, por quê celebrar?" https://labdicasjornalismo.com/noticia/6723/cronica-aniversarios-na-pandemia-por-que-celebrar e "Amar na quarentena: benção ou desafio?" https://labdicasjornalismo.com/noticia/6952/amar-na-quarentena-bencao-ou-desafio ) e quando falei sobre a minha tristeza perante a esta data, ela me incentivou a escrever também, espero que gostem.

Sempre fui muito próxima da minha família: minha conexão com meus familiares se assemelha a clássica contada em filmes sobre cidades pequenas: almoço de domingo com todos os primos, avós e tios, jogos de futebol, negócio familiar (somos donos da confeitaria da cidade). 

Então, imaginem minha insegurança ao abandonar todo esse conforto, e ir rumo ao desconhecido, sozinha na cidade grande?! Acrescente uma pandemia mundial e tudo é intensificado. Mas minha mãe: mulher trabalhadora, carinhosa, bela e inteligente (além de bagunceira, mas ninguém é perfeito). Sempre me deu apoio incondicional: “me ligue sempre, e venha no dia das mães!” É a fala que sempre me confortou.

Essa data é especial e repleta de tradições desde que me lembro por gente: café da manhã na cama com um vaso de flores silvestres, depois fazer pavê de sobremesa e assistir “Uma linda mulher” abraçadas no sofá com uma panela de brigadeiro e pipoca. Infelizmente, esse ano foi distinto.

Não pude visitá-la em decorrência do isolamento e apesar de apelarmos para a tecnologia (vídeo chamadas), a tristeza preenche meu peito, que desejava apenas pousar nela e sentir seu perfume, como um refúgio e lembrança de que tudo ficará bem. A tecnologia pode avançar, mas nunca irá suprir a necessidade de estar fisicamente perto de quem se ama.

E perante a toda essa solidão a cozinha tem sido nossa conexão: ainda sou novata no quesito “dona de casa” e sinto falta da comida caseira dela (galinha caipira, macarrão com almôndegas, lasanha, bolo de chocolate com morango), então sempre ligo para ela, e com muita paciência (pois não puxei a habilidade culinária da família) ela me ensina cada prato, sempre em meio a muitas risadas resultadas da sujeira que faço.

Nesses momentos ela me conta sobre como estão as coisas por lá (a cidade pode ser pequena, mas a boca dos habitantes não), e eu falo sobre cada novidade da cidade e faculdade (ela quer saber os mínimos detalhes). Pode até parecer bobo, mas são nesses momentos que sinto ela ao meu lado, sei bem que não está, mas imaginar se torna mais fácil.

Quando terminamos o prato, comemos “juntas” na mesa, e posso até dizer que estou ficando boa. Pois independente do prato, a primeira garfada sempre me faz viajar para um momento da minha vida onde eu era criança e da bancada observava ela cozinhar (às vezes ela até deixava eu misturar os secos, me sentia tão adulta).

Engraçado como uma refeição pode ter tanta bagagem emocional, não? Te levar para uma lembrança distante, para mais próximo de quem se ama, é como se, com aquela combinação de sabores, você sentisse um abraço quente e aconchegante por dentro.

A comemoração desse ano pode ter sido distinta, mas sei que quando tudo isso passar estaremos uma ao lado da outra novamente, sempre rindo, cozinhando e comendo. 

Até lá, fico aqui escrevendo para vocês com um prato de biscoitos de polvilho caseiros ao meu lado, minha mãe enviou pelo correio com o seguinte bilhete:

“Coma no intervalo entre as aulas, você está muito magra! Beijos, mamãe te ama!”

 

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