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12/06/2021 às 23h11min - Atualizada em 12/06/2021 às 22h48min

O espaço negro no cinema: Estereótipos e representação nas produções audiovisuais

Protagonismo branco nas narrativas cinematográficas negras

Isabella Leandra - Revisado por Damáris Gonçalves
Foto: (Divulgação)
O primeiro filme exibido da história foi lançado em 1896. Desde então, foi possível observar diversas transformações e formas de ver e fazer cinema pelo mundo. Contudo, nessa história, o negro teve sua presença pouco explorada, senão deturpada.
 
Filmes como O nascimento de uma nação (1915) demonstraram o pensamento de uma sociedade racista e uma população negra estereotipada. Parece loucura pensar que tal realidade não está tão distante. Entretanto, no desenrolar da história do cinema mundial e se estendendo até os dias atuais, os estereótipos e a desvalorização dos negros ainda estão presentes nos filmes, discreta ou indiscretamente. 

 

 
“A história única cria estereótipos, e o problema com os estereótipos não é que sejam mentira, mas que são incompletos. Eles fazem com que uma história se torne a única história”.

Essa frase foi dita por Chimamanda Ngozi Adichie, em seu livro O perigo de uma história única. Na obra, a autora conta sobre sua relação com os livros durante a infância e adolescência, e principalmente sobre como as histórias eram sempre escritas pelas mesmas pessoas e com os mesmos personagens: brancos. O problema se estende ao analisarmos o quão pouco o continente africano e a cultura negra é explorada nos filmes e séries. Sempre associados a miséria, a escravidão, sendo forçados a relembrarem de suas dores, mas quase nunca tendo uma história de sucesso ou um final feliz.
 

A Negritude no Cinema

A sub-representação dos negros nos filmes cria mais uma marca na identidade de um povo historicamente apagado e marginalizado. A hiperssexualização da mulher negra, os papéis comumente relacionados à domésticas, babás ou a amiga da protagonista branca que não tem narrativa própria. Filmes que normalmente representam o passado da escravidão, acabam limitando o negro a apenas aquilo que o machuca. Quantos negros empresários você já viu no cinema? Quantas garotas negras você já viu protagonizar alguma comédia romântica? Agora, quantos negros você já viu representando papéis de criminosos, miseráveis? Ao fazer essa rápida análise já é possível perceber os papéis esteriotipados que não prejudicam somente as narrativas audiovisuais.
 
Em uma rápida pesquisa feita entre as mais diversas faixas etárias, de oito negros entrevistados, todos responderam não se sentirem representados no cinema. O protagonismo é escasso, e quando aparece, é sempre falando sobre racismo ou sobre o passado de escravidão. Por vezes, isso desperta gatilhos na comunidade e não traz um sentimento de empodeiramento e representação. Comédias românticas são quase sempre protagonizadas por casais brancos, o que reforça a ideia de que as pessoas negras geralmente são representadas pelo sofrimento e raramente pelo amor ou leveza.
 
Carla Maia, doutora em Comunicação Social pela UFMG e pesquisadora no campo audiovisual, reforça a representação do negro em lugares de subalternidade e opressão nos cinemas mundial e brasileiro. Ela o relata como uma “instância de fabulação” que permite narrar novos mundos e realidades, e cita filmes como Cidade de Deus. Mesmo com forte presença e protagonismo negro, o clássico brasileiro acaba reforçando aqueles mesmos estereótipos que frequentemente relacionam o negro à marginalidade.  
 
Maia relaciona a tragicidade do cinema negro com o fato de serem diretores brancos criando narrativas para negros. A violência, mesmo sendo uma realidade, acaba excedendo às possíveis histórias e finais felizes que poderiam ser contados, e questiona: “Quando a gente só tem esse tipo de representação e o cinema só reforça e reconta a mesma história seguidamente, até que ponto estamos conseguindo imaginar e construir politicamente outras realidades para o povo preto?”. 
 
Dessa maneira, a forma como o negro é representado no cinema pode acabar mantendo os preconceitos já enraizados na sociedade. Este posicionamento reforça o imaginário popular de uma comunidade preta condenada ao sofrimento, à pobreza e à marginalidade. Para mudar tal realidade é importante não só a representação, mas a auto-representação do povo preto dentro e fora das telas. 

 

A Mudança 

Assim, movimentos como o Afrofuturismo buscam ampliar o imaginário e fugir da ideia do negro submetido aos mesmos lugares e funções. Direção e produção negra, histórias que fujam do convencional, terror, ficção científica e até mesmo um romance clichê. O cinema precisa disso para que pessoas negras ao menos sonhem e conheçam uma realidade fora da violência policial e do racismo estrutural.
 
Filmes como “Pantera Negra”, “A princesa e o sapo”, “Tudo e todas as coisas", "Nós", "Infiltrado na Klan" e algumas novas produções apresentam o negro em filmes de diferentes gêneros. Um cinema que traz o negro para novos espaços. A libertação das histórias únicas, destaca um presente e um futuro em que o espaço do negro no cinema independe de sua cor.

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