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17/10/2021 às 20h12min - Atualizada em 17/10/2021 às 18h54min

Suspensão do uso de máscaras pode estimular surgimento de variante, diz especialista

Epidemiologista, Paulo Petry tem doutorado e mestrado na área e adverte que ainda não é o momento para as autoridades decretaram fim à obrigação da proteção facial contra a Covid-19

Esther Morais - Editado por Ynara Mattos
Foto: Unplah - Sylwia Bartyzel



Doutor e mestre em epidemiologia e professor da disciplina na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Paulo Petry alerta sobre a origem de uma nova variante da Covid-19, caso os governos invistam em suspender por agora o uso de máscara em território brasileiro. “O risco é que o vírus volte e consequentemente surjam novos doentes, novas internações e haja o aumento da mortalidade”. 
 

Recentemente, a cidade de Duque de Caxias (RJ) decretou facultativa a vestimenta da proteção. Dias depois a medida foi revogada por decisão judicial. Capitais, como São Paulo e Rio de Janeiro, estudam flexibilizar o uso em espaços abertos. No entanto, Paulo afirma que embora a decisão seja mais branda, quando comparada à de Duque de Caxias, ainda é precoce. “Mesmo que a taxa de transmissão esteja caindo, a de vacinação ainda não atingiu a imunidade coletiva [quando cerca de 80% da população está imunizada]”. 

 

Em entrevista concedida ao Lab Dicas Jornalismo por videoconferência, o epidemiologista também dá esperanças ao apontar o final do ano como data possível para não mais usar máscara e, ao mesmo tempo estar seguro, isso se o fluxo de vacinação continuar avançando.
 

Considerando o cenário atual, é seguro suspender a obrigatoriedade do uso de máscara? 


Não, não é seguro. Nós temos que considerar dois aspectos para essa medida de flexibilização. Primeiro, as vacinas, que são, sem dúvidas eficazes e seguras, seja qual for. No Brasil, embora estejamos vacinando em torno de um milhão de pessoas por dia, nós começamos atrasados. A nossa taxa de vacinação para primeira dose está em torno de 73% da população e com a segunda dose, que confere efetivamente a proteção integral, nós temos cerca de 47% da população. Ainda é pouco quando se pensa em não usar máscara. E existe outra situação que deve ser analisada, sendo a taxa de transmissão (Rt), um indicador que dá ideia de como o vírus está circulando. Esse número hoje no Brasil é o menor desde que se começou a medir, está em 0,60. Isso quer dizer que, a cada 100 pessoas, o vírus pode ser transmitido para 60. Quando ele é menor que 1 isso indica uma desaceleração da circulação do vírus, o que é ótimo. Mas apesar do avanço da vacinação e da regressão da circulação do vírus, seria precipitado ainda neste momento abdicar desta importantíssima precaução que é o uso de máscara. Ainda é precoce. 

 

Quando a suspensão do uso de máscaras deixaria de ser precoce?

 

Quando a taxa de transmissão continuar caindo e a vacinação aumentar. Nós chamamos de imunidade coletiva, a ocasião em que o percentual de vacinados chega a cerca de 80%. Desde isso, o vírus vai perdendo a capacidade de se transmitir. É uma questão de tempo. Suponho que até o final do ano nós vamos estar com esses números. 

 

O prefeito de Duque de Caxias defendeu que “Quem quiser usar pode usar, mas o uso obrigatório já deu”. Entre duas pessoas, basta uma usar máscara e a outra não? 

 

Não. Esse sujeito é irresponsável, essa frase é um crime à saúde pública. Por exemplo, era possível fumar até pouco tempo atrás no avião, em qualquer ambiente fechado. Mas a ciência conseguiu mostrar que até o fumante passivo também adoeceria, então se implementou uma medida sanitária de saúde coletiva. É a mesma coisa para a vacina, se você não se vacina, você está expondo as outras pessoas à doença. A máscara é um gesto coletivo, se você usa, você está se protegendo e protegendo as pessoas ao seu redor. Se todos nós usarmos, nós estaremos nos protegendo coletivamente.

 

Quais indicadores devem ser analisados pelas cidades que querem fazer a suspensão?

 

A vacinação e a taxa de transmissão do vírus, que fala do ritmo de contágio. É claro que o ambiente aberto, por ter uma ventilação natural, é menos nocivo que um fechado. Afinal, o vírus é respiratório, ele se transmite através da fala, de gotículas de saliva e de aerossóis que expelimos ao falar. A recomendação é de que as pessoas ventilem os ambientes para ter circulação de ar. Mas ainda não é o momento de, nem mesmo em ambientes abertos, flexibilizar o uso de máscaras. Ainda que a taxa de transmissão esteja caindo, o que é positivo, a taxa de vacinação ainda não atingiu a imunidade coletiva.

 

Qual o principal efeito que essa desobrigação pode causar se efetivada agora no Brasil? 

 

O que pode acontecer e já aconteceu em outros países com a vacinação até mais adiantada que nós, como Israel, Reino Unido, Austrália. Eles tiveram que recuar porque tiraram a máscara precocemente e o vírus voltou a circular. O risco é que o vírus volte e consequentemente surjam novos doentes, novas internações e haja o aumento da mortalidade. Isso é um perigo porque estamos vivendo uma nova variante do vírus. O SARS-Cov-2, que era o responsável pela Covid-19 no início da pandemia, hoje é chamado vírus original, porque ele já teve muitas mutações. Nós tivemos em novembro de 2020, a taxa de transmissão mais baixa, à exceção da de agora, que era 0,68. Mas como muita gente relaxou com o final de ano, a mortalidade explodiu em março deste ano. Não podemos repetir este erro. 

 

É possível que, se houver a suspensão do uso de máscaras, surja mais uma variante?
 

É difícil de dizer. Mas é uma característica de todo vírus, quando eles ficam por muito tempo em circulação e as taxas de transmissão são muito altas, a hipótese de surgimento de novas variantes cresce. Existe, sim. Tivemos variante Alfa, Beta, Gama e agora estamos na Delta. Tem muitas outras, na Colômbia tem a Mu, a Lota, que surgiu em Nova Iorque, mas que não se espelharam devido às vacinas e dos cuidados que nós estamos tendo. Pode eventualmente aparecer uma nova variante. 

 

Referências: 


"Prefeitura de Duque de Caxias, RJ, publica decreto desobrigando o uso de máscara". Portal G1. Disponível em: . Acesso em: 11 de out. de 2021

BOCARDI, Rodrigo. SANTIAGO, Tatiana. "Cidade de SP estuda liberar uso de máscaras em locais públicos na segunda quinzena de outubro". g1 SP. Disponível em: . Acesso em: 11 de out. de 2021

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