02/08/2023 às 17h59min - Atualizada em 02/08/2023 às 17h59min
Opinião: Queda precoce na Copa mostra que seleção não evolui como esperado
Brasil falha na hora H em um grupo fácil; CBF precisa acordar para que Brasil não caia de patamar de uma vez por todas
Paulo Octavio
Desilusão: Bia lamenta eliminação precoce. Foto: Reprodução/Globo A eliminação na fase de grupos da Copa do Mundo Feminina é um grande anticlímax. Ainda mais após o ciclo com aspectos positivos na preparação para o Mundial. Houve contratação de uma técnica estrangeira (algo que é tabu no masculino) . Pia comandou a equipe nos quatro anos e observou o time na Copa América e amistosos contra europeus --- o que a CBF não consegue agendar para o masculino. Houve aumento do interesse da televisão e da mídia para cobertura da categoria. Assim como um processo de renovação.
Mas o sonho virou pesadelo.
Ver uma equipe com grandes nomes como Marta, Bia Zaneratto e Tamires não conseguir fazer um gol na Jamaica é dolorido. Ainda mais do jeito que foi com um pot-porrie de ataques inoperantes.
O óbvio ululante é culpar a Pia. Engraçado que ela foi apontada como melhor nome para substituir Vadão (fato comemorado por muitos). As únicas críticas da convocação para Copa foram a falta da Cristiane e escolha pela Bárbara e Mônica por “experiência”. Também reclamaram o fato de ela não falar português nas coletivas.
Mas não dá para passar pano e tapar os olhos para a gigantesca falha no gol da França e a demora para substituição no último jogo. Não dá para simplesmente achar que a renovação basta. É preciso resultados, o que a sueca e o elenco não entregaram.
Só que o problema tem raizes mais profundas. O narrador Marcelo do Ó foi muito feliz ao lembrar que o projeto de seleção parece falido. A CBF não faz um bom trabalho desde 2002. Passamos vergonha contra Croácia; depois no Mundial sub-20, na eliminação para Israel; e, agora, a Jamaica virou pedra no sapato As caribenhas, aliás, fazem parte de uma seleção que pede vaquinha para disputar a Copa e conta com apoio da filha cantora do saudoso Bob Marley.
Estranho ver que inúmeras boas jogadoras de destaque em suas equipes sucumbem na seleção. O Palmeiras reativou a categoria em 2019 e conseguiu superar os nervos contra o Boca na final da Libertadores feminina de 2022. Por que a Bia não conseguiu o mesmo na seleção? Geysi foi campeã no Barcelona, Tamires é multicampeã no Corinthians. Por que na seleção o panorama muda de figura?
Por que uma direção técnica não consegue traçar estratégias e alternância de esquema tático para um jogo importante?
A zagueira da Suécia Nilla Fischer criticou a Pia na biografia Jag sa inte ens hälften' ('Eu não disse a metade', em tradução livre; sem versão no Brasil). Fischer afirmou que a treinadora teve estabilidade emocional, pouco repertório tático e montou festinha em meio a uma competição em 2016. Será que teremos novos exposed em breve?
Tambem é preciso olhar para os times nacionais. Fora de São Paulo, a realidade dos clubes é tensa. Ceará perdeu investimento após a queda do masculino para série B, e as meninas só fizeram um ponto no Nacional em 15 jogos. Real Ariquemes se recusou a jogar contra o Santos em protesto ao atraso de salários, problema recorrente em inúmeras equipes. Embora essa dificuldade também acontece em outras modalidades esportivas, pois nosso país valoriza ex-BBBs e influencers e ignora o esporte.
Agora não adianta chorar o leite derramado nem ser oportunista e atirar rojões de festa agora que Brasil caiu e "a lacração foi derrotada". Como disse a Marta, o apoio a seleção está aí e as mulheres conquistaram inúmeras coisas nos últimos anos. Diferente de 2008 -- quando Barbara disputou as Olímpiada desempregada -- todas jogadoras atuam em grandes times, algumas até na Europa. Não haverá desmanche como em torneios anteriores.
Agora a Globo vive um morde e assopra com a Pia. A comentarista Ana Thais criticou o trabalho dela após o jogo. A jornalista tem razão ao cobrar postura das jogadoras porque não dá para pedir tanto e entregar apatia em um jogo decisivo. Posteriormente, Renata Mendonça disse que é importante “ter alguém com o peso da sueca na seleção”. A mesma mídia que acabou com Vadão, Luxemburgo e Felipão após vexames em 2000 e 2014, respectivamente, e atira pedras no Abel constantemente.
Caso CBF queira a saída da sueca, um provável substituto será Arthur Elias, técnico supercampeão com Corinthians. Mas nada vai adiantar se não houver um planejamento da entidade.
A chave do sucesso no novo ciclo está nas maos da entidade. É preciso mudança de postura, garantir investimento, preencher calendário das equipes e fomentar a base para que novas jogadoras apareçam. Sem oba-oba ou “vamo lá”. Sem politicagem e pedido de ponto facultativo, como se isso fosse aumentar interesse do público no esporte.
Também está nas mãos do público que não pode ser modinha e abandonar a seleção após uma eliminação. Nas mãos dos anunciantes que precisam investir na categoria.
Itália e Alemanha, que após 2014 passam vergonha no masculino e feminino, provam que a bola pune. A eliminação faz o Brasil cair das nuvens. Espero que acordemos desse pesadelo, ao menos, que seja para cuspir.