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22/09/2023 às 15h37min - Atualizada em 22/09/2023 às 14h59min

Pattrícia de Aquino: A Maria Bonita do Cangaço Novo

Os desafios e glórias de uma atriz no Brasil

Nathália Aguiar - Edição por Mayane Humeniuk
Pattrícia de Aquino em Cangaço Novo. Foto: Allan Souza Lima.

No Cine Teatro São José, pontualmente às 16h, nos encontramos. Eu, o sorriso e Pattrícia. Sim, o sorriso, pois este chega primeiro do que ela. Pattrícia tem um sorriso aberto que te convida a sorrir também e negar parece até injúria. Então, sorrio - e com isso, recebo mais um convite indispensável, o de conhecer sua história; e fazemos isso pisando no chão que já há algum tempo é sua casa: o palco. 

 

As primeiras casas de Pattícia, no entanto, foram em Campina Grande (PB), onde passou os primeiros meses de sua vida, e em São Domingos do Cariri (PB), onde viveu sua infância e adolescência. Criada até os 6 anos pelos avós, Alfredo e Das Dores, foi apresentada ao audiovisual muito cedo. Na garupa de um jumento guiado pelo seu tio, era levada para assistir sua, talvez, primeira paixão: as novelas. “Quando eu assisti Mulheres de Areia pela primeira vez, eu olhava pra Glória Pires e dizia 'eita, eu quero fazer isso na minha vida'”, conta a atriz. Quando atingiu a maioridade, então, fez as malas e partiu para o Rio de Janeiro, levando na bagagem, além de roupas, seu sonho de ser artista. 

Apesar de ser de uma família de músicos, poetas e repentistas, a paixão de Pattrícia pela arte não foi apoiada pelos seus familiares. Em 2001, quando saiu de casa para construir sua vida, foi contra a vontade do seu sangue. “Eu nunca desci do palco no Rio pra ter uma pessoa da minha família lá. Sempre eram amigos e parentes dos outros atores. Só começaram a me apoiar quando voltei pra Paraíba”, comenta. Isso, porém, não desmotivou a dramaturga. Para se sustentar no Rio e pagar o curso livre de teatro (que na época custava 250-300 reais), trabalhou com diversas coisas, mas sempre relacionadas à gastronomia - e, disso, chegou a montar seu próprio negócio na área. 

 

Foi a partir do teatro que Pattrícia de Aquino conseguiu sua primeira aparição nas telas, quando fez uma participação na minissérie “Amazônia: De Galvez a Chico Mendes”, da TV Globo, em 2007. Pattrícia conta que seu primeiro interesse na arte foi o teatro porque o cinema lhe parecia distante demais da realidade, devido às referências serem, em sua grande maioria, internacionais. Depois da participação em Amazônia e de retornar para Campina Grande em 2013, porém, seus olhos brilharam para o audiovisual e ela passou a enxergar a efervescência desta arte na Paraíba - principalmente na Rainha da Borborema. “Eu fiquei encantada com aquilo, com a grandeza da Paraíba. Lá fora, a galera não tem noção do que é o cinema paraibano, do que é o cinema campinense”, explica Pattrícia. Em 2013, no mesmo ano que retornou a sua cidade natal, participou do elenco de “Sobre Cabelos”, roteirizado e dirigido por Lincoln Ferdinand. O filme foi um desafio para a atriz, pois ela teve que raspar a cabeça para produção do curta. 


 

 

André da Costa Pinto, produtor cinematográfico e o idealizador e coordenador do Festival Audiovisual de Campina Grande - Comunicurtas, foi o responsável por abraçar o talento de Pattrícia e a colocar no meio cinematográfico, por meio de um curso de formação de atores de vídeo que lecionava na Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), sendo considerado pela atriz como o seu “padrinho” do cinema.

 

Apesar de ser apaixonada e ter sua maior experiência de tempo no teatro, há quase 7 anos 90% de sua vida está voltada para o cinema. “Quando a abelhinha do cinema pica você, é difícil sair”, brinca. O tempo dedicado à arte em vídeo lhe foi retribuído com mais de 30 premiações conquistadas em festivais de cinema do Brasil, que a consagraram com os títulos de Melhor Diretora, Melhor Filme e Melhor Atriz, pelos filmes “Rasga Mortalha” (2018) e “Joana” (2021), sendo, hoje, uma das diretoras mais premiadas do Estado da Paraíba. “Fico muito feliz e realizada por isso. Sabemos como é difícil chegar nesse lugar. Como mulher, precisamos provar todos os dias nossa capacidade e nesse meio não é diferente, tem muito machismo. Então, estar entre as diretoras mais premiadas da Paraíba é uma alegria muito grande e uma referência para quem está começando saber que é capaz de chegar lá também”, comenta a cineasta.

 

Foi Duda Ribeiro, ator e roteirista de grande importância para o meio, que acendeu em Pattrícia o desejo de construir a sua própria escrita, resultando, posteriormente, em diversos roteiros - e ser premiada por eles, como é o caso de Rasga Mortalha e Joana. Ambas as produções tiveram como cenário o mesmo que Pattrícia teve durante sua infância e adolescência, São Domingos do Cariri, mas contam histórias completamente diferentes. Enquanto “Rasga Mortalha” é baseado na lenda da coruja rasga mortalha, famosa no interior do Nordeste por ser uma ave “agourenta”, em “Joana”, Pattrícia conta uma história mais do que real, a da violência contra a mulher. Segundo a dramaturga, em entrevista para o Bom dia Paraíba, da Rede Globo, o roteiro do curta foi um grito de protesto. 

 

Foi também Duda Ribeiro que apoiou Pattrícia na sua decisão de ser professora, após ela sentir necessidade de passar o que estava aprendendo para outras pessoas. Sua primeira experiência dando aula foi ainda no Rio de Janeiro, em um projeto social para crianças de comunidade. Desde então, já ministrou diversas oficinas de arte cênicas em cursos livres no Estado da Paraíba. Hoje, além de ser bacharel em Teatro pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), está terminando a licenciatura em Teatro pela mesma Universidade. 

 

“Passar um pouquinho do que você sabe para o outro é muito importante, arte a gente não faz sozinho: é coletivo.”

As realizações da atriz paraibana no audiovisual não pararam nos curtas. Em Cangaço Novo, Pattrícia de Aquino se torna Maria Bonita. No meio da pandemia, em 2021, ela estava no interior quando soube que estariam acontecendo testes em João Pessoa (PB) para a série, mas decidiu não ir por conta da distância. Por acaso ou por destino, parte da produção se dirigiu também a Cabaceiras (PB); por ser próximo de onde ela estava, decidiu tentar. A partir daí, participou de um processo de testes até definirem que ela seria a Maria Bonita do Cangaço Novo. “Parecia que estava determinado que seria pra mim”, comenta Pattrícia. Sobre a experiência, ela conta ter sido assustadora na mesma medida em que foi gratificante. 

 

Maria Bonita é um mito, uma mistura de amor e ódio. Uma lenda.

 

Mesmo tendo sido lançada há mais de um mês pela Prime Video, a série se mantém entre as mais assistidas do Brasil. “Sinceramente, eu não pensei que fosse repercutir tanto. Mas não sei nem reagir ao feedback que eu tenho recebido, estava desacostumada, mas estou curtindo o momento e agradecendo demais”, explana. 

 

A atriz conta da empolgação que a equipe que realizou os testes para selecionar o elenco da série demonstraram ao ver seu registro profissional de atriz e destaca a importância disso para a profissão. “Nós estudamos anos e anos e vem uma pessoa que estourou na internet e ‘toma’ um lugar que poderia ser nosso. Não tem DRT? Então não faz! Tem que estudar! Ralar igual à gente rala”, comenta. De 2001 para cá, Pattrícia não parou em nenhum momento seus estudos. Curiosa, tem interesse em entender de tudo um pouco e hoje acumula os títulos de atriz, diretora, roteirista, dramaturga, professora de teatro e preparadora de elenco, capacitações que só foram possíveis por seu suor e dedicação. 

 

Infelizmente, a trajetória de um artista brasileiro passa por muitas turbulências. Os desafios têm sido maiores para Pattricia desde o sucateamento do setor cultural e do incentivo à arte no Brasil, à desvalorização do DRT e a “síndrome de vira-lata” do brasileiro, supervalorizando o que é de fora e deixando de lado a cultura do seu próprio país - inclusive, os governantes. “Passamos 4 anos sofrendo. Tinha uma criatura aí que nos deu uma rasteira muito grande, estávamos respirando com ajuda de aparelhos. Agora, aos pouquinhos, estamos dando uma respirada. Não que esteja bom, 100%, ainda precisamos muito de políticas públicas, precisamos que os governantes olhem para classe artística, que saibam a importância e o poder que nós temos. Quem nos salvava todos os dias na pandemia? Os artistas, com suas lives de shows, filmes, contação de histórias. Apesar disso, subimos um degrau”, explana a paraibana. 

 

Pattrícia de Aquino não está sendo egocêntrica quando diz, portanto, que é uma rocha. Afinal, lamentavelmente, na maioria das vezes, o cenário brasileiro pede isso dos nossos artistas: a força de uma rocha. “Me defino assim, porque quebra, mas se reconstrói. Já tomei vários tombos na vida, mas nunca deixei de voltar, como uma fênix, e lutar por aquilo que eu quero e sonho, cada vez mais forte”, finaliza a atriz. Como fênix, rocha ou como Maria Bonita, que Pattrícia de Aquino ressurja e abrilhante o cinema, o palco e a vida com sua arte!


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