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05/02/2021 às 17h43min - Atualizada em 05/02/2021 às 17h14min

Movimento Black Lives Matter é indicado ao Nobel da Paz

O BLM ganhou repercussão após a morte do norte-americano George Floyd em 2020

Letícia Feitosa - Editado por Ana Paula Cardoso
Movimento BLM surgiu em 2013. (Foto: Getty Images))

O Black Lives Matter (BLM) foi nomeado ao Prêmio Nobel da Paz 2021 pelo parlamentar norueguês Petter Eide, segundo o jornal britânico The Guardian. O movimento ganhou destaque em 2020 após a morte do negro norte-americano George Floyd, assassinado por um policial branco. O acontecimento foi o estopim para que grupos em todo o mundo fossem às ruas reivindicar pautas em prol do fim do racismo. 

 

O Prêmio aceita indicações de deputados, ministros, ex-laureados e alguns professores universitários, que têm até 2 mil palavras para justificar sua escolha. Neste ano, Eide, deputado da Esquerda Socialista (SV), nomeou o BLM por ter sido um movimento que influenciou o mundo a combater a injustiça racial, conforme afirmou o parlamentar. 

 

Para Mártir Silva coordenadora especial de políticas públicas para igualdade racial da Secretaria da Proteção Social, Justiça, Cidadania, Mulheres e Direitos Humanos do Ceará (Ceppir/SPS), a indicação é uma forma de legitimizar esse movimento e a causa antirracista. "Significa, mais que tudo, o reconhecimento de que o BLM desencadeou lutas dentro e fora dos Estados Unidos, assim como a compreensão de que o racismo é um fenômeno mundial", pontua.

 

A lista com os finalistas será divulgada no final de março pelo comitê do prêmio. O resultado da premiação será anunciado em outubro e a cerimônia ocorrerá em 10 de dezembro de 2021.

 

Vidas negras importam
 



Apesar de ter ganhado proporção e se expandido no ano passado, é um movimento que surgiu em 2013. A hashtag #BlackLivesMetter começou a ser usada nas redes sociais com a morte do adolescente afro-americado Trayvon Martin, mais uma vítima da violência policial. Desde então, o movimento se tornou conhecido pela organização de protestos contra a morte de negros causada por policiais e questões envolvendo a desigualdade racial presente nos Estados Unidos.

 

Em 2020, o movimento mostrou força após o vídeo do negro George Floyd circular na internet. Ao ser abordado em um supermercado por, supostamente, ter usado uma nota falsificada de vinte dólares, o norte-americado de 46 anos foi asfixiado por um policial branco. Pessoas de diversos países, incluindo o Brasil, foram para as ruas gritar o slogan do movimento: Vidas negras importam.

 

O professor universitário, historiador e pesquisador da história e cultura negra no Ceará Hilário Ferreira, afirma que houve esse crescimento dos protestos porque a realidade do racismo existe em vários países:
 

Desde a chegada dos escravizados no Brasil, quando eles se organizam em quilombos, se recuam a serem escravos, fazem suas revoltas individuais e coletivas, estão ali fazendo uma ação que se assemelha ao BLM. A greve negra de 1857 e as revoltas dos negros e negras escravizados foram movimentos que dizem "nossas vidas importam".

 

Mártir Silva aponta que o "BLM traz a denúncia de que há uma violência sistêmica sobre as vidas e corpos negros. Essa violência também é percebida no Brasil por nossos movimentos antirracistas". Embora a violência policial e sistemática contra negros seja comum em nacionalidades distintas, o professor Hilário Ferreira adverte que: "Nós precisamos levar em consideração as especificidades históricas de cada país". 

 

Ele ainda explica que, no Brasil, por exemplo, em relação à violência policial contra a população negra, a Polícia Militar (PM), historicamente, foi criada para reprimir os negros brasileiros. A corporação surgiu em 1808, com a chegada da família real ao país. "Ao chegar no Rio de Janeiro, a corte percebeu que haviam muitos negros para poucos brancos. Então, foi elaborada uma organização para proteger a nobreza", diz.

 

De acordo com os dados da Rede de Observatórios da Segurança, essa realidade de repressão por parte da PM continua. Em 2019, a maioria dos mortos pela polícia nos estados de Pernambuco, Bahia, Ceará, São Paulo e Rio de Janeiro, foram pessoas negras. O relatório também mostra que 87% dos mortos no Ceará eram pretos e pardos.

 

A violência também é vista nos números apresentados pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública, em 2019, 79% dos assassinados pela polícia eram pessoas negras. O historiador ressalta que "é preciso que a gente não só vá para as ruas, mas proponha medidas, políticas públicas e pressione os gestores para a criação de leis que eduquem ou acabem com a Polícia Militar".

 

Expectativas para o futuro

 

O professor analisa que a tecnologia, como as novas mídias e as redes sociais, auxiliaram na atuação do BLM. "Sempre existiu o racismo, a diferença é que agora nós filmamos. Tem que existir uma reação diante desse racismo sistêmico, dessa naturalização da violência policial contra os negros". 

 

Para a coordenadora da Ceppir/SPS, o movimento se tornou uma inspiração para outros grupos de ativistas antirracistas. "O mundo não poderia ignorá-lo, ainda mais acontecendo em um país como os Estados Unidos, que é influenciador para o bem ou para o mal", diz. Mártir ainda compartilha suas expectativas: "que eles tenham a capacidade política de se constituir como uma referência importante do processo de civilização".
 

Em relação ao futuro dos movimentos negros, em especial os brasileiros, Ferreira destaca que amadurecimento é necessário. "O movimento negro precisa aprofundar e discutir o racismo, falar sobre a ideologia cultural presente no imaginário do próprio negro. Deve ter trabalho de base, buscar conhecer a nossa história e resgatar as nossas lideranças", aponta.

 

Nobel da Paz 



 

Desde 1991, o prêmio Nobel da Paz é concedido a pessoas e/ou organizações que promovam o progresso da humanidade, de acordo com a vontade de Alfred Nobel, seu criador. Em 2020, o ganhador foi o Programa Mundial de Alimentos (PMA), agência humanitária que oferece alimentação a 90 milhões de pessoas em 80 países. 


Além do movimento Black Lives Matter, foram indicados para o prêmio esse ano, segundo a agência de notícias AFP: o fundador do Wikileaks, Julian Assange; o trio de oponentes bielorrussos liderados por Svetlana Tikhanovskaïa; Organizações em prol da vacinação, a Coalizão para Inovações de Preparação para Epidemias (CEPI) a Gavi COVAX Advance Market Commitment; Organizações que trabalham pela liberdade de imprensa, Repórteres Sem Fronteiras (RSF) e o Comitê para a Proteção dos Jornalistas (CPJ);  A rede internacional de verificadores de fatos, International Fact-Checking Network (IFCN) e até mesmo o ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump.
 
REFERÊNCIAS:

BELAM, Martin. Black Lives Matter movement nominated for Nobel peace prize. The Guardian, [S. l.], p. 1-1, 29 jan. 2021. Disponível em: https://www.theguardian.com/world/2021/jan/29/black-lives-matter-nobel-peace-prize-petter-eide-norweigan-mp. Acesso em: 1 fev. 2021.

REDE DE OBSERVATÓRIOS DA SEGURANÇA. Dados inéditos comprovam que negros são o alvo da letalidade policial nos cincos estados monitorados pela Rede de Observatórios. Rede de Observatórios da Segurança, [S. l.], p. 1-1, 9 dez. 2020. Disponível em: http://observatorioseguranca.com.br/cor-da-violencia-negros-sao-o-alvo-da-letalidade-policial/. Acesso em: 4 fev. 2021.

FÓRUM BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019. [S. l.], 2019. Disponível em: https://www.forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2019/10/Anuario-2019-FINAL_21.10.19.pdf. Acesso em: 4 fev. 2021

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