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25/06/2021 às 16h16min - Atualizada em 25/06/2021 às 16h06min

Rotina e pandemia: os desafios enfrentados por pessoas do espectro autista no isolamento social

Para pessoas com TEA, manter uma rotina é muito importante e são ainda maiores os impactos da pandemia para essa população

Dara Russo - Editado por Marceli Maria

De etimologia francesa, routine, ou em português, “rotina” significa “trilha batida” ou “curso costumeiro de ação”. Manter um hábito de organização do cotidiano aumenta as possibilidades de se desempenhar da melhor forma as atividades do dia a dia. Para pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA), a rotina é ainda mais importante, pois esses indivíduos possuem, em alguns casos, dificuldades para se comunicar e dependência nas atividades de vida diária. Com a pandemia de Covid-19, consequentemente, pessoas que se encaixam no espectro e seus familiares tiveram de adaptar suas vidas.

 

Virgínia Nunes Viana, psicóloga e mestre em Neurociências pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), explica que para o paciente autista, a rotina ajuda a controlar o ambiente. “Tendo em vista que a maioria dos autistas apresenta um repertório verbal limitado, a previsibilidade do ambiente é extremamente importante”, afirma. Além disso, uma das características do transtorno é a existência de padrões repetitivos e ritualizados de comportamento. 

 

Crianças autistas são mais inflexíveis na rotina, apresentam dificuldades com transições, possuem padrões rígidos de pensamento, rituais de saudação e a necessidade de fazer o mesmo caminho, ou ingerir o mesmo alimento diariamente. “Deste modo, as mudanças ambientais podem levar a alterações comportamentais gravíssimas”, completa.

 

Ensino remoto traz mais desafios

A psicóloga aponta que a mudança de rotina provocada pela pandemia, por si só, já é um problema para uma criança autista. Portanto, a substituição do convívio social pelo uso da tecnologia nas atividades, incluindo as escolares, cria desafios ainda maiores para alunos com TEA. Uma criança do espectro tem prejuízo em três domínios: comunicação, interação social e alterações no comportamento (restritivos ou repetitivos). “Portanto, o uso de tecnologia não possibilita o contato social pessoalmente, a comunicação fica limitada, porque o treino de olho no olho, emitir e responder comandos ficam distanciados pela tela”, aponta Virgínia.

 

Ela ainda explica que alguns de nossos comportamentos são modelados sutilmente durante a interação social, e a falta desse contato compromete o desenvolvimento de habilidades importantes para o convívio. Na ausência da possibilidade de retomar o contato pessoal e o atendimento presencial, recursos remotos podem ser utilizados. “É importante ressaltar que essa criança, antes de mais nada, precisa ser avaliada para observar sua capacidade de se manter diante de uma tela, só então podemos pensar numa intervenção personalizada”, pontua.

Estratégias para o aprendizado

Durante o isolamento social, é importante que as famílias de pessoas com TEA organizem seu tempo para amenizar os impactos da quebra da rotina. “Dedicar um tempo de qualidade com esta criança, programar atividades juntos, é possível que possa compensar a falta de interação social de alguma maneira”, diz Virgínia. Entretanto, ela ressalta que tudo depende do nível de comprometimento que a criança tem de acordo com seu transtorno.

 

Quanto às ferramentas e estratégias que podem melhorar e facilitar o aprendizado de crianças e adolescentes com TEA na pandemia, a psicóloga cita o estímulo da  leitura (através da equivalência de estímulo) e a comunicação alternativa, através dos métodos TEACCH e PECS. Desenvolvidos nos Estados Unidos nas décadas de 1960 e 1980, respectivamente, ambas as abordagens buscam melhorar as capacidades físicas, cognitivas e de comunicação de pessoas autistas, visando sua independência.

 

Na era digital, também existem opções complementares como  o aplicativo FoFuuu.  O app, de origem brasileira, tem duas versões que disponibilizam  jogos e atividades que auxiliam no desenvolvimento de crianças do espectro autista. Tudo foi pensado por especialistas e tem como base métodos como o ABA (análise do comportamento aplicada) e o A.G.E.S. (modelo de aprendizagem acelerada). A coordenação motora fina, a cognição, a criatividade, o processamento auditivo e a consciência fonológica são alguns dos âmbitos estimulados.

Importância de acompanhamento

Mesmo frente às dificuldades gerais da busca por ajuda médica na pandemia, Virgínia afirma que a  procura pelo diagnóstico do autismo se manteve e ainda não existem estatísticas, mas pode ser que tenha até aumentado. “Os pais que estão em casa, estão observando e lidando mais com as dificuldades comportamentais da criança, o que está fazendo que ele procure mais o atendimento médico”, ilustra. 

 

A psicóloga recomenda que, frente a um diagnóstico recente, intervenções e tratamentos devem ser realizados o mais cedo possível. Para aqueles que já realizam acompanhamento, é ainda mais importante não interrompê-lo. Diversas instituições disponibilizam de forma gratuita, cuidados e orientações para pessoas com TEA e não pararam suas atividades durante o período pandêmico. 

 

”Temos as faculdades que retomaram os atendimentos clínicos presenciais, feito por estudante e sob supervisão clínica de profissionais”, cita Virgínia, que atua como professora na Faculdade Pitágoras de Betim. Além disso, os Centros de Atendimento Psicossocial Infantojuvenil (CAPSi), em algumas cidades, podem assumir opapel de orientar e tratar pacientes com TEA. As unidades básicas de saúde (UBS), também contam com profissionais orientados para oferecer orientações e encaminhamentos aos profissionais necessários.

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