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24/07/2021 às 07h08min - Atualizada em 24/07/2021 às 06h17min

Star Trek: O valor da vida

Lucas Campos - Editado por Ana Terra
Não é de agora que Star Trek pavimenta o caminho para discussões das mais variadas. Em Star Trek: A Nova Geração, Picard e sua tripulação se deparam com questões metafísicas no café da manhã, três vezes na semana. Nos episódios The Measure of a Man e The Quality of Life (O Valor do Homem e Qualidade de Vida, respectivamente), o Comandante Data (Brent Spiner), um androide, tem o valor e a importância de sua vida questionado diante de seus olhos, mas não é só isso, os episódios também trazem questionamentos para aqueles que não possuem um cérebro positrônico ou capacidade de processamento de 800 trilhões de dados por segundo.

Em O Valor do Homem, o Comandante Maddox (Bryan Brophy) deseja dissecar Data para aprender como fazer mais androides, sendo Data o único em todo o universo. Data se recusa, pois não acredita que o cientista tem a capacidade necessária para fazer o procedimento de maneira segura. Se vendo sem alternativa, Maddox apela para regras sombrias da Federação que podem declarar Data como propriedade da organização. Quando confrontados pela possibilidade de perder seu estimado amigo, Capitão Picard (Sir Patrick Stewart) e sua tripulação recorrem a um julgamento para decidir se Data é ou não uma forma de vida e propriedade da Federação.

Capitão Picard é colocado contra a parede durante o julgamento e pede conselhos a Guinan (Whoopi Goldberg), que lhe apresenta o maior insight possível para o assunto. Guinan, em um discurso digno de Star Trek, oferece ao Capitão a solução. Caso Maddox consiga criar inúmeros novos androides, eles seriam como pessoas. Toda uma nova raça de pessoas descartáveis e propriedade, cujo único propósito é servir a Federação em suas naves. Sendo eles dispensáveis, não haveria necessidade de pensar em como eles se sentem, seu bem estar ou mesmo suas vidas. Como já aconteceu na História. Consegue pensar em algo?

É claro que o episódio está falando de escravidão. O valor de Data como indivíduo vivo e senciente seria perdido no momento em que outros dele fossem feitos apenas com o intuito de serem mão-de-obra de uma organização que diz ser um vetor da paz. O que o diferenciaria de meras ferramentas na nave ou de um computador qualquer?

Star Trek nunca falha em fazer o espectador considerar o peso de coisas que são tomadas por garantidas. Às vezes é difícil pensar que o valor de um personagem possa refletir tão fielmente, ainda que com floreios, a essência da vida e das pessoas. É a sensibilidade e a sutileza da conversa entre Guinan e Picard que leva o telespectador a pensar na situação de Data. Mesmo com Picard dizendo a palavra “escravidão” diretamente, não se estampa na tela em letras garrafais “ESCRAVIDÃO É RUIM”, porque se espera que se saiba disso. Guiar o telespectador a uma experiência é a prova de uma construção e compreensão do tema é sempre o melhor caminho para uma obra.

No episódio Qualidade de Vida não é diferente. Os exocomps, robôs criados por uma cientista capazes de se adaptar a qualquer situação, começam a criar consciência e se recusam a fazer trabalhos que podem colocar sua vida em risco. A cientista se recusa a aceitar a possibilidade de serem vivos e Data decide ajudá-los a atestar sua consciência.

É bom primeiro pensar porque o Data faz isso. A médica da Enterprise, Doutora Crusher (Gates McFadden) diz que o androide é um ser único no universo, o que ele entende como um ser solitário. Não há nenhuma outra forma de vida artificial como ele conhecida e, portanto, ele está sozinho. Sem pares ou iguais que possam entender seus dilemas e por isso é tão importante para ele que prove a consciência dos exocomps.

Data e a médica da Enterprise discutem o que é vida e percebem que pelas definições básicas Data não se encaixava, mas ainda era considerado como vivo. E é quando Data entende que vida não é definida por explicações prontas e genéricas. O conceito de estar vivo é definido pela estrada que um indivíduo segue e as batalhas que enfrenta em prol de sua existência.

Os exocomps são validados como seres vivos ao fim do episódio quando um deles decide se sacrificar pelo bem dos outros. A moral do episódio talvez esteja no valor que mesmo as menores formas de vida possuem e nas decisões que podem fazer.

Os exocomps decidiram quando se salvar e quando não. Quando fazer algo ou não fazer. Assim como Data escolheu não se submeter aos projetos de Maddox. O livre arbítrio talvez seja a maior forma de demonstração de que se está vivo.


Há muito mais que se possa falar, mas menos que se possa entender sem assistir. Star Trek possui temporadas disponíveis na Amazon Prime, Netflix e Paramount+.

REFERÊNCIAS
Data's concern for the exocomps (Star Trek "The quality of life"). 1 vídeo (5 min). Publicado pelo canal Data fan. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=UXrd4xkaG2U&ab_channel=Datafan>. Acesso em: 20 de julho de 2021.
Star Trek TNG S2E9: Picard and Guinan on the nature of value, property and disposable creatures. 1 vídeo (2 min). Publicado pelo canal 
Anatol Baumgarten. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=-T9TUeapBSQ&ab_channel=AnatolBaumgarten>. Acesso em: 20 de julho de 2021.
The Definition of Life - Star Trek TNG. 1 vídeo (5 min). Publicado pelo canal WILLwork4BEER22. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=5OfIsNPZm8w&ab_channel=WILLwork4BEER22>. Acesso em: 20 de julho de 2021.
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