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13/06/2021 às 00h55min - Atualizada em 11/06/2021 às 15h30min

Série "Pose" destaca moda como uma das raízes da esfera LGBTQIA+

A moda sempre pareceu um local de acolhimento para a comunidade, todavia, ainda são encontrados desafios

Amanda Borges - Editado por Larissa Barros
Billy Porter como Pray Tell em Pose. Foto: FX Network/ Reprodução: IMDb

A série Pose, do canal Fox Networks Group (FX), - que terminou no segundo domingo desse mês - revolucionou a indústria midiática ao trazer atrizes trans em papel de protagonismo, algo que não vemos com tanta frequência, ou se vemos são atores cis interpretando tal papel. Os personagens têm uma relação de grande apreço com determinadas peças de roupa. A moda é um elemento essencial para a identidade da comunidade e a estrutura da cultura ballroom, que foi um movimento político e artístico nos anos 60 no Harlem, periferia de Nova York. Negros e latinos da comunidade LGBTQIA+ competiam nesses bailes, com muita moda, beleza e voguing

 

Na terceira e última temporada, conhecemos um pouco mais sobre Elektra Abundance, personagem transgênero, feita pela modelo e atriz Dominique Jackson. Vemos que um casaco de pele branco, a primeira peça de pele verdadeira que ela conseguiu comprar, tinha muito significado, pois, aquela roupa a aqueceu em muitas noites frias e a lembrou de nunca desistir. 
 

Dominique compartilha muitas semelhanças com sua personagem, que passou por muitos desafios para sobreviver assim como muitas pessoas da comunidade LGBTQIA+, uma vivência que infelizmente ainda perpetua em nossa sociedade, principalmente no Brasil, onde travestis e mulheres trans são quem mais sofrem com a violência. Segundo dados do Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra), em 2020, 175 travestis e mulheres trans foram assassinadas. Infelizmente e vergonhosamente, essa situação continua progredindo, basta ver os noticiários.

Por muito tempo, a comunidade LGBTQ+ foi inviabilizada, e é de conhecimento histórico que na moda muitos designers famosos eram gays. Gianni Versace, Jean Paul Gaultier, Alexander McQueen, Halston, e muitos outros através de suas criações divulgavam a cultura queer e ajudaram a moldar as tendências das passarelas de hoje em dia. Porém, quem desfilava eram apenas homens e mulheres cisgênero. 
 

Atualmente, a indústria tem entendido o poder e a importância da diversidade não só racial, mas também de gênero. Vemos modelos não-binários e andrógenos, como Rain Dove e Erika Linder, desfilando looks femininos e masculinos para marcas como Tom Ford e Louis Vuitton. Atrizes transgêneros que estão fazendo sucesso ultimamente também estão nas passarelas, Hunter Schafer e Dominique Jackson roubaram a cena na primaveira 2021 da Mugler, que aconteceu no dia Internacional da Visibilidade Trans.

No ano passado, a modelo plus size, negra e trans, Jari Jones, apareceu em uma campanha nos mês do orgulho para a Calvin Klein. A campanha tinha além da Jari, mais oito modelos LGBTQIA+. Na época, Jari compartilhou uma foto em seu instagram que mostrava ela comemorando em frente a um outdoor em que aparecia segurando uma garrafa de champagne. Na legenda, a modelo e também ativista falou sobre como seu corpo foi muitas vezes marginalizado e visto como feio.
 

De acordo com uma pesquisa feita pela empresa de marketing para criadores de conteúdo, Traackr, que analisa o desempenho de aproximadamente 40.000 influenciadores ao redor do mundo, os consumidores têm engajado e mostrado mais receptividade com publicidades que tenham pessoas de diferentes identidades de gênero.
 

Contrariamente, essa bela realidade que vem progredindo na indústria, não se reflete tanto no varejo de moda, e se ainda falta diversidade e visibilidade, as pessoas que sofrem com a transfobia e a gordofobia sabem bem disso.

“Quando eu chego nesses espaços, eu não sou atendida, eu preciso chamar a atendente, para pedir informações, isso quando não me descartam logo na entrada 'Não tem roupa pra você, aqui só veste até o 35'", relata Quésia Sonza, travesti sergipana que atua como modelo, atriz e apresentadora.

  

Quésia tem um trabalho de suma importância, em suas redes sociais abordando temas ligados à comunidade LGBTQIA+, gordofobia, religiões de matriz africana e periferia. Ela conta que sempre teve uma relação com a moda, e que acabou se tornando um de seus trabalhos, mas que sente medo, pois a exclusão de corpos iguais ao seu e a falta de acessibilidade de roupas que a sirvam, faz com que esse âmbito acabe sendo algo distante para ela.

 

 “O que eu vejo na moda é que fazem roupas pensando nas pessoas magras, e dizem que são acessíveis para gordos, mas não é. Hoje existem várias lojas, que já trabalham em cima da população gorda, mas, os valores são exorbitantes”, ressalta Sonza. “Às vezes, sai mais em conta mandar fazer uma roupa do que comprar. Um vestido que você gastaria 100 pra mandar fazer, tem loja que vende por 600, quem é pobre como eu, não tem como comprar", afrma.

 
Para muitas pessoas da comunidade LGBTQIA+, as peças de roupa podem trazer um significado a mais do que apenas algo que tampa seu corpo, mas também é uma forma de representação social, uma afirmação do que você representa e quem você é. Quésia conta com carinho sobre uma peça que a representa. “Eu tinha uma saia, que foi a primeira saia que eu mandei fazer, ela foi a roupa que eu me senti, sabe? Porque eu mandei fazer do jeito que eu queria e imaginava e ficou lindo", disse a modelo.
 
Apesar de ter ocorrido uma evolução progressiva da indústria, muitas marcas ainda parecem dar visibilidade a comunidade LGBTQIA+ apenas em datas comemorativas. Mesmo existindo empresas que tem a comunidade como seu branding, não podemos glamourizar a indústria e achar que tudo é feito com as melhores intenções de propagar diferentes gêneros e corpos. Por isso, é preciso visualizar a situação com um olhar crítico, pois a moda também é feita de propagandas de marketing e sabemos que isso para muitos é uma jogada para vender.
 


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