Nova Iorque, Londres, Milão, Paris, Copenhagen e São Paulo: o que essas capitais têm em comum? Todas são palco de inovação e inspiração, todas sediam Fashion Weeks. Mas para entendermos esse fenômeno nos dias atuais, é preciso voltar dois séculos.
Segundo Brunno Almeida Maia, pesquisador em filosofia e teoria de Moda pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), uma Fashion Week não só é uma forma de concentração das propostas dos criadores de moda, mas sim de organização de calendário de criação, produção e difusão comunicacional. “Há um caráter estratégico - concentração da atenção de jornalistas, formadores de opinião e compradores em um período determinado - e prático - indivíduos se concentram em uma semana para conhecer e analisar as propostas dos criadores de moda. Assim, a Fashion Week organiza as cadeias criativa e produtiva, mas também funciona como uma forma estratégica de comunicação”, afirma o pesquisador.
A ORIGEM
Considerado o pai da alta-costura, Charles Frederick Worth recebe dos historiadores a atribuição de ter sido o pioneiro, ainda no século XIX, a apresentar as criações da sua 'House of Worth' em modelos, ao invés de manequins. Na época, os desfiles aconteciam no interior das casas de moda, no entanto, tal privacidade acabava se tornando acessível através da estratégia dos costureiros de investirem no espaço público com modelos usando suas produções.
Mas, apenas em 1943, a história marca o início do fenômeno das Semanas de Moda. Idealizada pela relações-públicas Eleanor Lambert em Nova Iorque, a "Press week" ou "Semana da Imprensa", foi motivada pelo contexto da Segunda Guerra Mundial. A impossibilidade de viajar à Europa, em conflito e sem investimentos em moda, para ver as coleções ocasionou um despertar para os talentos locais.
Eleanor Lambert reuniu designers americanos que objetivavam fomentar suas criações e profissionais da área da comunicação para a divulgação das produções. Mesmo após a guerra, o evento criou raízes e foi renomeado como New York Fashion Week (NYFW). Ainda hoje, a capital é considerada uma das principais quando o assunto é moda no mundo e é a grande responsável por abrir o calendário da moda.
Paralelamente, em 1945, com a criação do Chambre Syndicale De La Haute Couture, elaborada para proteger a alta-costura francesa das ameaças nazistas da Segunda Guerra, as marcas passaram a organizar desfiles de maneira ordenada.
Com a reconstrução europeia pós-guerra, a França retoma a indústria da Alta-Costura e, em 1947, é inaugurada a Semana de Moda de Alta Costura. As apresentações eram feitas de modo semelhante ao atual, com desfiles realizados para um público composto de, principalmente, indivíduos da imprensa e compradores. Nesse contexto, Christian Dior apresentou a histórica coleção onde introduziu uma nova concepção de feminilidade com a silhueta "new look", desfile que revolucionou a moda.
ATUALMENTE
Séculos passaram, a influência da moda na sociedade se fortaleceu. Atualmente, o calendário segue da seguinte maneira: duas vezes por ano, acontecem os desfiles de prêt-à-porter feminino, durante o fashion month — apelido que se refere aos meses que reúnem as 4 principais capitais da moda (Nova Iorque, Londres, Milão e Paris) - com Outono/Inverno apresentado em Fevereiro e Março e Primavera/Verão em Setembro e Outubro. Além das clássicas, várias outras cidades criaram suas semanas de moda, como a SPFW (São Paulo Fashion Week), e semanas temáticas, como a Bridal Fashion Week, focada em noivas, por exemplo.
OS OBJETIVOS
Por meio de desfiles que duram de 7 a 15 minutos, marcas almejam ambientar os convidados em uma nova esfera. Cada desfile conta uma história, são retratos das coleções. Todos os detalhes, de trilha sonora até perfil dos convidados, são planejados para construir a narrativa proposta pelo designer, transmitir a mensagem e proporcionar uma experiência para o público. Além disso, a expansão das mídias sociais altera a dinâmica dos desfiles na medida em que, com a espontaneidade e velocidade das informações, momentos virais são benéficos para o cenário comercial das marcas.
“Existe hoje nas Semanas de Moda a preocupação em construir imagens e narrativas. Narrativas eu denomino toda forma de comunicação estético-visual. Você tem a campanha, o editorial, o fashion film, a vitrine e, evidentemente, o desfile. O desfile tem, ao contrário das outras narrativas, caráter comercial, mas sobretudo artístico. Ainda é a forma de apresentação de uma coleção mais adequada, pois é no movimento dos corpos, que se revela a proposta não só de modos de vestir do criador, mas também da gestualidade. E nesse ir e vir, é analisado se o criador de moda cumpriu ou não o proposto em termos de criação. É o corpo vestido e o movimento na passarela que desvela não só o caráter criativo, artístico, mas a viabilidade comercial daquela coleção”, ressalta Brunno.
OS IMPACTOS
As Semanas de Moda são elementos fundamentais para o cenário da moda global. Com a perpetuação de gigantes do mercado e ascensão de novas marcas, o setor criativo se movimenta e a indústria se fortalece, de forma que a influência da moda na sociedade se torna cada vez mais presente, determinando padrões de consumo e comportamento. Sobretudo no contexto tecnológico atual, em que o formato das apresentações é pensado e executado para ser visto em tempo real de qualquer lugar do mundo.
“Vejo as semanas de moda como um fenômeno da globalização. Vários modelos, jornalistas e designers de todo o mundo se reúnem e fazem uma troca. Eu assisto o que o designer de Paris fez e noticio no Brasil, por exemplo, e isso vai criando uma cadeia mundial em que a moda e as tendências tornam-se globais. Em dezembro, você pode ir a uma loja de departamentos no Brasil e em uma da Itália, e você encontrará coisas muito parecidas, criando essa homogeneização fashion. No fim, o principal objetivo e impacto é ser um reflexo da nossa realidade econômica e social transparecidos em roupas”, afirma Mateus Barbosa, fundador do perfil Hylentino.
A partir de características específicas inseridas em cada Fashion Week, as marcas, assim como o próprio público, se direcionam para as localidades mais consonantes ao seus perfis, fator determinante para a execução dos eventos.