Lab Dicas Jornalismo Publicidade 728x90
31/10/2021 às 17h47min - Atualizada em 31/10/2021 às 15h47min

SÍNDROME DO PÓS COVID : UMA REALIDADE VAGA

Aproximadamente 70% dos infectados pela covid vem relatando a permanência dos sintomas mesmo após a recuperação da doença

Gabriela Ukracheski - labdicasjornalismo.com
Grupo Oto
Sensação de estar sempre cansado, esquecer coisas corriqueiras, trocar palavras e sentidos, não sentir cheiro ou gosto, insônia, pesadelos, queda no cabelo, desregulação dos sistemas do corpo. Sintomas diferentes, mas com uma causa em comum, infecção pelo vírus da COVID 19. Passar pela infecção causada por um vírus que apenas ao testar positivo para a doença já causa pânico, não é um processo fácil para a grande maioria dos brasileiros, isso porque em seu ápice de contaminação o vírus e seus efeitos ainda eram um terreno desconhecido para a ciência e a medicina.
 
Estima-se que 87% dos brasileiros já contraíram o vírus, o número é mais do que o dobro da média global de 42%, segundo dados divulgados pela Kantar. Mas em contrapartida a essa estimativa, segundo dados do Ministério da Saúde, 18.907.243 pessoas que tiveram a doença já se recuperaram.
 
Após passar por um período conturbado com milhares de pessoas infectadas, esperava-se que após a “cura” da doença a medicina e a ciência pudessem tranquilizar a população. Porém, um novo fenômeno do vírus, vem causando desconforto na grande maioria dos brasileiros que foram infectados com a COVID 19, a Síndrome pós COVID, COVID Longa ou as Sequelas agudas do pós COVID. Essa definição foi dada para designar um conjunto de problemas de saúde, que podem ser frequentes ou permanentes e que interferem na qualidade de vida de um indivíduo. De 236 milhões de pessoas diagnosticadas com COVID em todo o mundo desde dezembro de 2019, a previsão é que mais da metade deverá sentir sintomas pós COVID até seis meses após a recuperação, de acordo com pesquisadores da Penn State College of Medicine, a pesquisa foi publicada no periódico “Jama” nos Estados Unidos.


 
Durante a doença, muitos pacientes relataram cansaço extremo, dificuldade para respirar, dores nas articulações, perda do paladar ou do olfato, funções do corpo desreguladas, como por exemplo, suor em quantidade excessiva, entre outros. Aproximadamente 70% dos infectados pela covid vem relatando a permanência desses sintomas mesmo após a recuperação. Essas sequelas podem surgir em qualquer pessoa que teve contato com o vírus, até mesmo os considerados assintomáticos (que não manifestaram sintomas mesmo após a infecção), são sintomas de natureza cardiológica, neurológica, hematológica, dermatológica ou psicológica.

 
A analista de suporte técnico, Juliana Alves, 29 anos, de São Paulo, sempre teve uma memória impecável até ser acometida pela COVID 19 no início deste ano, agora conta com uma dificuldade de se concentrar e se recordar de coisas simples e corriqueiras: “É mais frequente quando alguém está conversando e puxa alguma coisa que eu fiz ou falei… Ai eu fico, não lembro, mas se a pessoa disser que aconteceu hoje de manhã e tal, aí eu lembro, mas no primeiro momento muita coisa eu esqueço”. Juliana relata que isso ainda não tem afetado seu trabalho por estar trabalhando em casa, mas outros sintomas têm interferido emocionalmente no seu dia a dia.
 
Ainda conta que até mesmo cinco meses após a COVID não conseguia sentir cheiro e gosto das coisas, hoje seu paladar está retornando aos poucos, mas ainda não consegue sentir com exatidão o cheiro. A moça que é mãe lamenta a falta de olfato, “eu não consigo sentir o cheiro do meu filho, o cheiro da pele dele, geralmente quando você encosta em uma pessoa você consegue sentir o cheiro dela, eu não consigo. Consigo sentir o cheiro da cabecinha dele porque eu passo shampoo e condicionador. É horrível, porque ele é pequeno ainda, sinto que estou perdendo essa fase tão gostosa de ficar cheirando o bebê”.
 
Outro fator que causou estranheza em Juliana e que impulsionou a mesma a buscar ajuda profissional, foi o fato de seu ciclo menstrual estar desregulado, algo incomum para a jovem que relata ter a vida toda um ciclo corretíssimo, “dois meses após a COVID a minha menstruação estava durando duas semanas, e ela era sempre foi três a cinco dias. Quando isso “normalizou”, começou a vir numa quantidade bem maior também”. A ginecologista que atendeu Juliane, disse que essa poderia ser uma causa, ou interferência do vírus no seu sistema hormonal.
 
O caso da analista é só mais um entre milhares de outras reclamações vindas dos sobreviventes da COVID. É relatado que cerca de 50% dos recuperados reclamam de fadiga e fraqueza e que de 10 a 15% dos acometidos podem evoluir em quadros com inflamação do músculo cardíaco, o que atrapalha o bombeamento de sangue para os órgãos, além de notar certas debilidades na capacidade de oxigenação no sangue, dificuldades respiratórias e para piorar um mau funcionamento nas trocas de gases do pulmão.
 
O agente SARS-CoV-2 que causa a Covid-19 pode atingir o sistema nervoso e como resultado causar distúrbios do paladar ou do olfato, comprometimento da memória e diminuição da atenção e concentração, aspectos que são frequentemente observados em alguns sobreviventes. Os sintomas se manifestam de formas e frequências diferentes em cada paciente. Das consideradas mais leves se caracterizam a memória fraca, sentidos bagunçados (olfato e paladar), insônia, queda de cabelo e cansaço em excesso, das mais graves e mais apontadas por um número considerável de pacientes estão as dores fortes de cabeça, tosse persistente, dores na costa e fibrose nos rins (alteração crônica nos pulmões).
 
Esses sintomas podem resultar de uma resposta violenta do sistema imunológico desencadeado pelo vírus, por infecção, reinfecção persistentes ou até um aumento na produção de anticorpos direcionados aos próprios tecidos do corpo humano. Os profissionais de saúde perceberão uma abundância de pacientes, que eram saudáveis antes da infecção por Covid-19, com problemas psiquiátricos e mentais, como depressão, ansiedade ou transtorno de estresse pós-traumático.


 
Em entrevista dada para a Veja Saúde a médica de Reabilitação do Hospital Israelita Albert Einstein, Milene Silva Ferreira contou: “Na prática, estamos vendo que uma em cada três pessoas que tiveram sintomas da infecção apresenta acometimentos 12 meses depois da fase aguda, independentemente da severidade do quadro e do grau da resposta inflamatória”.
 
Vale ressaltar que a intensidade do dano varia com a severidade do quadro da infecção. Um exemplo são os pacientes que precisaram ficar na UTI e receber oxigênio, além das sequelas físicas e psicológicas que eles encontraram no pós covid, a recuperação desse grupo é mais lenta, ou seja, mais preocupante e que demanda de mais assistência médica.

Segundo, João Augusto de Oliveira (57), Diretor municipal da saúde da cidade de Riversul, interior de São Paulo: “(...) notamos que os pacientes que tiveram altas após intubação, tiveram mais dificuldade em retornar com sua vida normal, seja por dificuldade motora ou por dificuldade respiratória. Alguns se mantiveram em oxigênio por meses após a alta hospitalar.”
 
Mas, o rigor do quadro não pode interferir no tratamento médico, e isso quer dizer que a saúde não deve menosprezar sintomas e sim acolher e ouvir a todas as reclamações dos pacientes acometidos, pois é exatamente por se tratar de um terreno desconhecido que é necessário precaver e não adiar. A saúde precisa garantir atendimento de qualidade a todos, mas priorizando os casos de acordo com cada urgência de cada um: “Todos os pacientes, conforme as queixas que apresentaram durante o tratamento da Covid, são orientados a seguir o tratamento com nossos médicos ou outros profissionais, ex. psicólogo e fisioterapeuta” conta João Augusto.


 
Inúmeras são as incertezas que rondam sobre esse assunto e que preocupam as milhares de pessoas que foram acometidas pelo vírus: Como saber se são sequelas permanentes? É necessário realizar uma bateria de exames? Quais são os tratamentos? Os sintomas são preocupantes? Mas talvez a mais importante delas seja porque tudo isso acontece?
 
Quando de fato os sintomas terminarão ainda é uma pauta aberta a discussão, bem como quais exames são necessários e exatos para fundamentar um diagnóstico conciso, possíveis medicamentos e formas de tratamento, entre outras preocupações.
 
Os meios pelos quais a Covid-19 vem causando sintomas persistentes em sobreviventes não são totalmente compreendidos, não há caminhos certos a serem seguidos, a falta de previsões e estudos ou conhecimentos acerca dessa problemática, causam polêmica e pânico, e neste cenário onde tudo é absoluto na ciência, são as incertezas que dominam.
 
No momento ainda não é possível identificar se as sequelas irão se tornar comorbidades, ou seja, a combinação de duas doenças, ou se serão passageiras, mas é totalmente válido e recomendável buscar a ajuda de um profissional se até alguns meses após a contaminação sintomas característicos do vírus continuam persistindo: “Por enquanto não dá para avaliar se algumas sequelas se tornarão comorbidades ou se serão sequelas passageiras, por exemplo alguns pacientes após seis meses ainda reclamam de falta de paladar, mas especialistas dizem que com o tempo o paladar voltará normalmente. Ocorreu também de alguns pacientes que tiveram alterações na glicemia, mas a grande maioria deles já tiveram seus quadros de saúde estabilizados.”- Relata o diretor da saúde.
 
Os tratamentos para a síndrome do pós covid ainda são superficialmente conhecidos, isso porque através das reclamações de sintomas aparentes os médicos vão buscar tratar os pacientes através daquilo que já se tem conhecimento. Por exemplo, não existe uma fórmula que faça o cérebro voltar a funcionar normalmente, ou até mesmo um remédio que faça os sentidos retornarem, mas existem alternativas para trabalhar no retorno desses sentidos, como fazer exercícios para a mente, cheirar coisas com um cheiro mais forte a fim de estimular o retorno, ajuda de um psicólogo para lidar com os traumas pela situação, uns irão precisar de oxigênio mesmo fora do hospital, outros precisarão de fisioterapia para que os músculos comecem a funcionar corretamente, são as alternativas terapêuticas conhecidas que trazem consigo a esperança de tudo retornar a normalidade.

João Augusto explica: “Não existe protocolo específico para isto, da mesma forma que se trata os sintomas durante a Covid, se trata os sintomas (quando existem) no pós Covid.”


 

 
A saúde demanda de protocolos a serem seguidos para assistir esses pacientes, e eles precisam começar a ser implementado o mais breve possível, das infinitas incertezas, a única certeza concreta é a de que o problema existe e ele precisa ser tratado.
 
Enquanto esses protocolos ainda não são uma realidade, pequenas iniciativas privadas de estudo e projetos acontecem, um deles é o estudo “sinais e sintomas da covid-19 em pacientes recuperados e a percepção da necessidade de reabilitação fisioterapêutica” é coordenado pelo professor Rinaldo Guirro e executado pela pesquisadora Andréa Meneghini e pela graduanda Karen Pereira, todos da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, também como iniciativa da FMRP foi desenvolvido um estudo que faz parte do projeto Recovida e acompanha sobreviventes da Covid 19 com sequelas leves ou graves, e contou com a médica Rosália Antunes, Íelen Ferreira Costa, a fisioterapeuta Lívia Pimenta Bonifácio, o professor Rodrigo Jorge (Coautor) e os demais educadores Fernando Bellissimo Rodrigues, Eduardo Melani Rocha, Valdes Roberto Bollela.

 
 
 Para mais informações confira também o Podcast: " Eu te explico", uma produção do G1 Bahia.




 
Link
Tags »
Notícias Relacionadas »
Comentários »