O Papa Emeritus IV. (Foto: Reprodução/Ghost - Facebook)Você chega a um festival de música ansioso para ver a sua banda favorita, mas enquanto espera chegar a vez dela tocar você decide dar uma checada nas outras bandas que estão se apresentando naquele dia. Eis que surgem diversos músicos encapuzados, vestidos com robes cerimoniais, empunhando seus instrumentos e começam a tocar, anunciando a chegada da sua figura principal: uma espécie de Papa macabro.
Esse é o Ghost. E essa situação descrita foi muito comum no início dos anos 2010 nos grandes festivais de música - sobretudo os voltados à música mais pesada. Uma banda com identidade única (mas recheada de referências), hoje o Ghost é uma das grandes bandas do cenário heavy metal e, suas peculiaridades e performances atmosféricas - verdadeiras missas profanas - foram determinantes para sua ascensão.
Originado na Suécia, em 2008, o Ghost mistura heavy metal, rock progressivo e psicodélico das décadas de 1960 e 1970 com novas tendências do som mais pesado e uma forte influência do pop, como por exemplo de seus conterrâneos do ABBA. A banda é formada pelos Nameless Ghouls - os instrumentistas anônimos da banda, que tocam mascarados - e liderada pelo Papa Emeritus, o vocalista da banda, que é “substituído” a cada novo álbum lançado.
Pode parecer confuso, mas, na verdade, essa mitologia criada em volta da banda é apontada por muitos como o segredo do seu sucesso. Durante muitos anos, a banda foi envolta em mistério, ninguém sequer conhecia o vocalista e líder da banda. A cada álbum trocando o seu manto, de Papa Emeritus I para II, III, etc, Tobias Forge conseguiu se manter no anonimato durante anos, até que disputas judiciais com ex-membros trouxeram sua identidade à tona e ele teve que se revelar como a mente por trás da banda.
Mas por que esse teatro desperta tanta curiosidade?
Nós gostamos de histórias, vamos concordar sobre isso, certo? Assistimos filmes, lemos livros, histórias são atrativas, nos prendem. No marketing, existe uma técnica que é utilizada com frequência que se aproveita bastante disso, que é o storytelling. A habilidade de contar histórias utilizando recursos audiovisuais e palavras ajuda a promover um negócio, causar reações no público e prender a sua atenção.
Em um cenário onde os grandes medalhões já estão estabelecidos há décadas, como Metallica, Iron Maiden e Ozzy Osbourne, Tobias Forge entendeu que somente a sua paixão pela música talvez não fosse o bastante para a sua banda se tornar um expoente. Um grande fã de filmes de terror, Forge decidiu unir suas duas paixões e criar um produto único, que pudesse se conectar com o público de uma forma única.
Tobias, então, planejou o Ghost para ser uma banda que, com toda a sua imagem e sons característicos, priorizaria a sua arte. Conforme certa vez um Nameless Ghoul (provavelmente o próprio Forge travestido) afirmou:
"Eu acho que um dos equívocos mais comuns é quando afirmam que escolhemos ser anônimos para ganhar atenção. A ideia sempre foi a de não ter personalidade ou individualidade na forma como as celebridades atuais buscam. O objetivo era ter as pessoas se concentrando no trabalho artístico. Se a música não fosse boa, eu não acho que as pessoas teriam se importado com a nossa aparência."
Mesmo após a revelação da identidade de Tobias, a banda segue mantendo a sua mitologia, realizando a troca de Papas a cada álbum e desenvolvendo sua história em seu canal do youtube. Essa postura segue mantendo cada vez mais fiel a base de fãs da banda - que hoje já é atração principal dos maiores festivais da Europa, como o Hellfest, da França e rendeu um Grammy - e a expandindo cada vez mais, como, por exemplo, recentemente, quando a banda viralizou uma de suas músicas no TikTok e figurou pela primeira vez na principal parada da Billboard.
Controversa, a banda segue sua expansão, com temáticas satanistas em suas letras, embrulhadas em uma linda roupagem pop misturada à toques dos primórdios do heavy metal (algo como se a Lady Gaga e o Black Sabbath tivessem formado uma banda junto). E Tobias Forge sabe muito bem o que está fazendo. Suas letras à primeira vista podem parecer apenas algo para chamar a atenção, mas na verdade carregam duras críticas à sociedade, religião e relações humanas.
Se esse texto despertou a sua curiosidade, escute o Ghost, assista a alguns clipes como esse abaixo, do seu último álbum “Impera”. O som, a estética e as histórias dessa banda são um convite para uma incrível história que pode até parecer de terror, mas que não se leva tão a sério assim. E, se você não gostar, tudo bem, segundo o próprio Tobias, até os haters são bem-vindos.
Vídeo oficial de 'Spillways', do album Impera. (Reprodução: Ghost - YouTube)
