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07/07/2020 às 23h52min - Atualizada em 07/07/2020 às 23h52min

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA - São Paulo tem 707 novos casos registrados no mês de junho

"Eu estou com algum problema psicológico, alguma trava ou problema de aceitação. Não tenho força pra sair desse tipo de relacionamento” diz vitima de agressão

Anna Francischini - Editado por Barbara Honorato

Em 22 de Março de 2020, foi decretada quarentena no estado de São Paulo por conta da pandemia do COVID-19, que chegava ao Brasil quase um mês antes. Desde então,de acordo com dados obtidos pela secretaria de direitos humanos e cidadania da prefeitura de São Paulo, que reúne dados de CRMs (centro de referência da mulher) e unidades móveis de atendimento, e considerando todas as subprefeituras do município e algumas do estado, os números de casos de violência contra a mulher teve um aumento significativo a cada mês desde o início da quarentena. O recorde de violência é registrado no mês de junho, onde até agora foram contabilizados 707 casos, o que representa um aumento de 103,02% em comparação ao mês de maio.
 
No site da prefeitura de onde os dados foram retirados, não há informações de casos neste mesmo período do ano passado (2019), porém ao comparar com os últimos 3 meses antes da quarentena, de 22 de Dezembro de 2019 até o final de Fevereiro, haviam registrados um total de 638 ocorrências de violência doméstica contra a mulher.
 
Com base nesses dados separados por regiões do município de São Paulo, pode-se constatar que em todos os distritos houve um pico de casos de violências no mês de junho. Os distritos com mais casos são os da zona sul, com 360 casos. E o distrito com menos casos foram os da Zona Oeste da cidade, com 64 no total.


                                 


 

Em meio à pandemia, crise mundial financeira e emocional, algumas mulheres têm enfrentado bem mais do que as preocupações de saúde e emprego que parte das pessoas: a violência doméstica e o medo constante de estar convivendo quase 24 horas por dia com o seu agressor. Jaqueline, hoje com 25 anos, conta que desde criança presenciou agressões domésticas vindas do pai - viciado em álcool, chegava em casa nitidamente alterado e “disposto a brigas e a quebrar as coisas da casa”. Junto a mãe e aos 3 irmãos, se trancavam no quarto, porém o agressor ainda tentava arrombar a porta, em busca de mais violência.
 
A mãe faleceu de câncer, e as crianças passaram a morar com algumas tias e a avó, que se organizavam em meio às dificuldades para criá-los. Jaqueline conta que sempre se sentiu carente de família e amor, e que antes do atual marido, já esteve em outros relacionamentos conturbados. O primeiro casamento ia bem no início, porém, após a gravidez foi morar junto do parceiro, e “entrou de cabeça na maternidade”, o que segundo a vítima a afastou do marido. Enquanto Jaqueline ficava em casa cuidando da filha e das tarefas domésticas, ele saia com os amigos, e até então, não se incomodava com isso, porém, quando ela resolveu ir trabalhar, ele passou a implicar com as suas amizades do trabalho a ponto de fazê-la desistir de 2 empregos. Um tempo depois, descobriu que nessas saídas de “churrasco” e “jogar bola”, ele estava sendo infiel, o que provocou o fim do casamento.
 
De acordo com a vítima, é difícil do homem divorciado aceitar o bem-estar da mulher posterior ao casamento. “A separação não foi fácil, porque o homem quando vê a mulher se dando bem é difícil de aceitar, foram brigas, minha filha vendo, traumas. Morávamos de aluguel, ele não queria ir embora, eu não tinha como ir e brigamos pela casa, pelas conquistas. No entanto, entregamos à casa, ele vendeu tudo, eu fui embora morar com um irmão até eu me ajeitar. Ele ficou com tudo.”
 
Atualmente, Jaqueline está em um novo relacionamento que, segundo ela, é bem turbulento”. O companheiro não aceita que ela tenha amigos homens, persuadindo para que ela se afaste deles, inclusive de amizades femininas. “Ele é bem machista, diz que mulher tem que cuidar dos filhos, da casa, trabalhar, ajudar. Bom do mesmo jeito ele olha meu celular, desconfia de tudo e todos.”, desabafa. E, assim como o pai de Jaqueline, o atual companheiro tem vícios e fica agressivo, quebrando coisas, gritando e ofendendo. “Estou vivendo tudo de novo desde criança. Queria muito que fosse diferente, mas a mudança vem de mim”, comenta.
 
Ainda reforça que as agressões não ocorrem somente no período da quarentena. “A convivência devido ao isolamento ajuda a ter mais casos, mas a violência já vem de berço. O isolamento é difícil pra quem tem vício, meu companheiro mesmo, ele é do mundo, acorda sai pra casa dos amigos, volta, toma um banho e sai de novo, só chega para dormir na madrugada entre 3 horas à 6 horas da manhã. Eu estou com algum problema psicológico, alguma trava ou problema de aceitação. Não tenho força pra sair desse tipo de relacionamento”, diz.
 
O nome da vítima é fictício, mas a história não. Assim como na de Jaqueline, a violência doméstica se repete na vida de milhares de mulheres, e em alguns casos levando ao feminicídio, e não apenas no estado de São Paulo, não apenas no Brasil, mas mundialmente. Apesar do país ocupar o 5º lugar no ranking mundial de violência doméstica.

INSTITUIÇÕES E PROFISSIONAIS 

Em entrevista, a psicóloga Lindy Longhi, do município de Campinas, relata que o número de mulheres que a procuram por conta da violência doméstica subiu consideravelmente desde que o isolamento social foi decretado no estado, e aponta um padrão de comportamento entre os agressores, que normalmente tem o quociente de adversidade baixo e são agressivos, apesar de alguns não serem  agressivos o tempo todo, ainda assim cometem erros prejudiciais.
 
Sobre as vítimas, também há um padrão de comportamento emocional, com duas características predominantes, que é o medo da reação do agressor ao romper com o ciclo de violência, e o sentimento de incapacidade de se manter economicamente. A faixa etária de mulheres atendidas nessa situação por ela é de 35 a 55 anos.
 
Ainda segundo a psicóloga, todas as suas pacientes relataram que sofriam violência antes do período de quarentena, mas as agressões se intensificaram, e o estresse do convívio gerou maiores prejuízos emocionais, fazendo-as a procurar ajuda psicológica. 
 
Em pesquisa feita em ONGS de atendimento à mulheres, constatou que normalmente esses agressores são ciumentos, abusivos, explosivos, controladores e, em alguns casos, narcisistas. E o tipo de violência mais comum é a física, moral e psicológica, mas, a patrimonial e sexual também são comuns.
 
FEMINICÍDIO

O feminicídio é um termo utilizado para definir quando a vítima é assassinada por conta do seu gênero. E, de acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) o feminicídio cresceu em 41,4% no Estado de São Paulo, por conta do isolamento social, que tem aumentado a vulnerabilidade das vítimas, já que elas passam a estar mais tempo em casa com os seus agressores. A pesquisa foi feita em 12 estados, que apresentaram um aumento em média de 22% de casos, e São Paulo é o responsável por pelo menos metade deles. Para chegar a esse número, os dados foram comparados com o mesmo período de 2019. 
 
Apesar do governo de ter implementado o boletim de ocorrência online, a FBSP aponta que o número de denúncias caíram, contribuindo para esta disparada de mortes pelo feminicídio.
 
LEI MARIA DA PENHA
 
Em 2018, foi sancionada no Brasil uma lei que aumenta a penalidade para o crime de feminicídio. Caso o crime seja cometido em descumprimento da Lei Maria da Penha (11.340/06) o agressor terá um acréscimo de ⅓ a metade da pena original.
 
O Código Penal prevê reclusão de 12 a 30 anos para o feminicídio, com agravantes quando a vítima tem menos de 14 anos, mais de 60, deficiência física, durante a gravidez ou 3 meses após o parto.
 
PARA DENUNCIAR:
Disque 100 (Direitos Humanos)
Disque 190 (Policía Militar)
Disque 180 (Central de atendimento a mulher)
Ou faça um boletim de ocorrência online

 
Peça ajuda!

 

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