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19/03/2021 às 11h50min - Atualizada em 19/03/2021 às 11h21min

Jean Baudrillard abre nossos olhos para uma nova perspectiva sobre o BBB 21

Sua obra "Simulacros e Simulação" traz questionamentos sobre reality shows

Hellen Almeida - Editado por Roanna Nunes
Ilustração: Jean Braudrillard e BBB/ Reprodução: Hellen Almeida

Não é novidade para ninguém que o Big Brother Brasil (BBB), edição 21, tem causado grande comoção por parte de seus telespectadores. Desde a edição passada, onde o isolamento social se instalou e continua até os dias atuais, ter a oportunidade de buscar uma fuga de nossa angustiante e incerta realidade por meio do programa tem sido considerada a preferência por grande parte do povo brasileiro, e sua influência no nosso cotidiano é inegável. Porém, por qual razão gostamos tanto de assistir reality shows? Sobre esses questionamentos e diversos outros, Jean Baudrillard em “Simulacros e Simulação” (1991) aponta:

“Não se trata de segredo-perverso — de violar uma intimidade. Não se trata de segredo nem de perversão na experiência-verdade-, mas de uma espécie de arrepio do real, […], de uma transparência excessiva”.

Sua afirmação pode levar nossa sociedade a reflexão: será que a resposta está relacionada não apenas ao entretenimento, mas também a sensação de poder dada ao público-alvo de decidir o futuro dos participantes?

Baudrillard: quem foi?

Jean Baudrillard (1923–2007) foi sociólogo, filósofo e fotógrafo francês. Através de suas obras, criticou o consumismo, os meios de comunicação e as massas sociais (acreditando que tais são cúmplices do estado atual do corpo social). Em sua obra “Simulacros e Simulação” escrita em 1991, defende que o mundo pós-moderno não vive uma realidade, mas sim um simulacro (quando a simulação do real é tão perfeita, que já não somos capazes de diferenciá-los) ele aborda o fascínio da população pelos reality shows no capítulo “O fim do panóptico”.
























Essa parte da leitura vem para mostrar o desejo humano de observar, ainda que não perceba que ele é observado pelo mesmo instrumento que o observa: a TV, ela que sabe suas vontades e anseios, é justamente nesse misto entre observar e ser observado que a simulação começa. Não há real e fantasia, tudo no mundo se mescla até o ponto em que vivemos uma grande simulação.
 

Posicionamento de Baudrillard X Situações do BBB 21
 
Aqui, iremos fazer uma relação entre as citações do filósofo acerca do tema e cenas do próprio BBB 21.


1. Coisas pequenas intensificadas ao máximo:

Já tivemos diversas situações de brigas por alimentação no programa, especialmente em se tratando da 'xepa' que contém uma diversidade de alimentos limitada. Podemos citar como exemplo que na edição atual, o instrutor de crossfit, Arthur mostrou sua indignação ao ver que comeram da sua cesta de ovos. Para quem tinha o costume de comer 24 por dia, ver esse número ser reduzido para 5 já é um baque, e quando percebeu que alguém diminuiu essa quantidade, uma discussão foi iniciada.

Ao primeiro olhar, é um aborrecimento simples, mas no ambiente onde são inseridos todos estão à flor da pele, e tudo vira motivo de abalo. Sobre isso, o sociólogo afirma que:

“O insignificante é exaltado pela filmagem. Aí se vê que o real nunca foi (mas como se você aí estivesse)”.

Ou seja, tudo é exaltado para o prazer do público, até mesmo o desespero, e muitas das vezes compramos as brigas dos participantes por, especialmente em um isolamento (como eles), nos identificarmos com suas angústias.

2. Atitudes questionáveis= Reflexo da sociedade:

Os fatos não mentem — tão pouco quando filmados — Em pouco mais de 1 mês da edição presenciamos cenas de bullying, manipulação psicológica, xenofobia, participante desistindo da edição por tamanhas injustiças e diversas outras atrocidades que tem sido muito criticada aqui do lado de fora. Sendo para a estudante de jornalismo, Karine Santos, esse um dos maiores motivos do hype da edição: “Teve abuso psicológico e bifobia por parte do chamado, gabinete do ódio (Karol Conká, Projota, Lumena e Nego Di), com o participante Lucas Penteado, causando até mesmo sua desistência do programa”, afirma.

 

Porém, trago aqui um questionamento: será possível que os integrantes sejam as únicas pessoas com atitudes questionáveis em todo o país ou o que ocorre lá é apenas a nossa realidade escancarada para todos que assistem à edição? Nossa estudante afirma que unir pessoas distintas acaba resultando em uma análise de “parâmetro social”: “Colocam várias pessoas diferentes em um lugar fechado, e fazem vários testes com eles, de forma física e psicológica, resultando assim, em um reflexo comportamental do povo brasileiro”, opina a jovem.

Sob a mesma temática, nosso autor afirma que:

“Trata-se […] de um espetáculo sacrificial […]. O drama litúrgico de uma sociedade de massas”.

Portanto, conclui-se que expor sua personalidade dessa forma é um risco e holocausto a sua vida—o que com a cultura do cancelamento é mais verdadeiro do que jamais foi — em função do entretenimento alheio.


3. O poder do público reflete nas porcentagens de eliminação:

Esse ano bateu o recorde na porcentagem de votos para a eliminação de uma 'sister': a rapper Karol Conká é dona desse título com cerca de 99,17% dos votos a favor de sua eliminação. Tal porcentagem é um espelhamento claro do poder de julgamento dos espectadores perante as falas e posicionamentos dos participantes. Perante a eles, independente de nossa idade ou vocação, somos julgadores da mínima fala pronunciada, somos responsáveis por definir seu futuro naquela casa. Já pararam para pensar em tal soberania?

 

Pois, o nosso autor já, ele afirma que esse é justamente o grande objetivo de um programa desse gênero: fazer com que o povo se sinta não apenas no poder, mas no direito de exercer a crítica de acordo com seus próprios conceitos do certo e errado:

“Já não há imperativo de submissão ao modelo ou ao olhar. VOCÊS são o modelo! VOCÊS são a maioria”, afirma.

Já nossa futura jornalista alega que mesmo esse sendo o grande objetivo da programação, exercer tal função por muitas das vezes é complexo, já que as opiniões sobre os 'Brothers' e 'Sisters' mudam a cada instante: “Apesar de o jogo ter sido feito para julgarmos, não acho correto, pois, de acordo com a evolução do jogo, mudamos de opinião muito rápido”, conclui a adolescente.

Sob meu olhar:

Concordo com Jean Baudrillard acerca das verdades que rodeiam um entretenimento do gênero e ainda assim gosto de assistir. A intenção dessa matéria não é de forma alguma julgar quem assiste o BBB 21 ou qualquer outra atração de mesmo objetivo, mas sim causar em cada leitor a reflexão sobre o que ele está assistindo.

Não se trata de simplesmente uma diversão para distração das inquietações alheias, mas sim de um experimento social maquiado de diversão. Portanto, acredito ser importante compreender o que de fato estamos assistindo, assim como o nosso poder de influência sobre isso e também o contrário: a influência que eles têm sobre nós.


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